quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Vidas soterradas

O título choca os leitores do jornal Zero Hora. Mas as cenas transmitidas na televisão chocam muito mais. Aqui no Rio Grande do Sul, livre da tragédia que assolou a cidade maravilhosa, a gente fala da traição do Ronaldinho, do calor e das férias, como se o cotidiano fosse comum. Mas não, não podemos estar alheios a quase 500 mortes, a famílias que não conseguiram salvar móveis nem casas, a estradas destruídas. A lama, esgoto e mortificação. Sairei em férias em 24 horas. Viajarei a praia, mas não me sinto digna de desfrutar o benefício a que tenho direito. Vi uma mulher no alto de uma casa esperando por resgate com três cães. Os vizinhos lançam uma corda. Ela a segura com uma mão, porque tenta salvar pelo menos um dos seus cachorros. Mas cai na água, vem uma onda de água suja e a faz mergulhar. Ela se vê obrigada a largar o cão. É salva sob gritos de uma voz feminina desesperada: salva ela, salva ela.
Hospitais e casas destruídas. Soterradas pelo barro. Carros atirados em cima de residências. A gente fica indignado quando em uma queda de luz, queima a televisão ou outro aparelho eletrônico. Imagina então uma vida perdida, mesmo que a vítima não tenha sido morta. Uma vida marcada por um trabalho que paga um, dois ou três salários mínimos, que seja. Um clima de guerra. A repórter diz que já perdeu a conta de quantos corpos passaram enrolados em sacos plásticos. A maior tragédia climática do Brasil. A força arrasadora das águas subjugou o Brasil. A natureza, tão bela e tão mãe em muitas ocasiões, dá o troco como sabe pela ocupação das encostas, ocupação ilegal e o asfalto que escoa a produção, mas é um temível inimigo do meio ambiente. Eu queria que isso fosse um filme de ficção científica. Mas o dia depois de amanhã chegou de forma inacreditável. Um longa-metragem que não é de ficção. É de horror.

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