Assim ensinou-me a vida nos últimos dias: a felicidade tarda, e às vezes anda de marcha-ré. Olho para o horizonte e para todas as coisas que me são pertinentes, subitamente percebo que ela não está fora, mas dentro de mim. Só que não apreendo esse conceito. Acontece que ela estão tão bem guardada, que não a encontro nos recônditos do meu ser. Mas eu sei que, genuinamente, ela está em minha essência. Como está na essência de todos. Este é o mundo dos sentidos e até a realidade é ilusão, por isso é perigoso depender desse universo sensorial. Preciso olhar devagar para mim mesma e buscar o pote da felicidade, aquele a que tenho direito e que só eu, inegavelmente eu, posso resgatá-lo.
******************
O vazio do budismo
" O homem que realiza a consciência de si mesmo sente que já não é o servo obediente de um impulso cego, senão que é seu próprio amo. Sente então que a gente comum, cega ante sua consciência inata e clara, percorre a rua como cadáveres vivos.!
(Chang Chen Ch)
sexta-feira, 25 de junho de 2010
sábado, 19 de junho de 2010
Hora marcada
Faltam três dias. Compactuo com Einstein que concebeu a ideia de que o tempo é relativo. Há duas semanas, eu chegava às sextas-feiras sob um torpor bom, degustando cada minuto que eu teria do fim de semana. E a segunda-feira parecia chegar num flash, como se entre a sexta e o domingo à noite,transcorresse apenas um milésimo de segundo. Bem se diz que tudo está em constante movimento. Eu não imaginaria nas minhas cenas mais férteis que ansiaria tanto pela segunda-feira. Agora, este segundo que está passando, este mesmo que você está lendo essa palavra. Foi rápido para você? Para mim são gotas de eternidade. Tudo porque estou na luta pelo Bom Combate, aquele travado em nome do meu coração. Um episódio (com toda a ebulição dos sentidos) dará uma guinada em minha vida. Eu já tracei mil imagens sobre esse encontro. Já tive medo de que fosse um desencontro, um desencanto. Mas estou cheia de enlevo. Sou a donzela moderna que está no alto da torre do castelo da solidão. E para quem espera o resgate, o tempo se arrasta como um cavalo coxo.
Mas as batidas do coração parecem entrar em frenesi. Tem um livro, que acredito eu, meio mundo leu. O Pequeno Príncipe, de Saint Exupery conta um ritual de pessoas que se cativaram: "se chegares às quatro, desde as três começarei a ser feliz". É assim, você se torna eternamente responsável por aquilo que cativas. Os passos do Lancelote em questão, terão um som diferente, porque é o caminhar dele que eu vou ouvir chegando na hora marcada. Vou morrer de felicidade uma hora antes, antecipando a fruição do encontro, que eu espero, seja de almas.
***
Homenagem a Saramago
"Deus, o diabo, o bom, o ruim, tudo está na nossa cabeça, não no céu ou no inferno, que também inventamos. Não percebemos que, tendo inventado Deus, imediatamente nos escravizamos a ele."
(morreu nesta sexta-feira, de falência múltipla dos órgãos.Este sim, o seu ponto final)
Mas as batidas do coração parecem entrar em frenesi. Tem um livro, que acredito eu, meio mundo leu. O Pequeno Príncipe, de Saint Exupery conta um ritual de pessoas que se cativaram: "se chegares às quatro, desde as três começarei a ser feliz". É assim, você se torna eternamente responsável por aquilo que cativas. Os passos do Lancelote em questão, terão um som diferente, porque é o caminhar dele que eu vou ouvir chegando na hora marcada. Vou morrer de felicidade uma hora antes, antecipando a fruição do encontro, que eu espero, seja de almas.
***
Homenagem a Saramago
"Deus, o diabo, o bom, o ruim, tudo está na nossa cabeça, não no céu ou no inferno, que também inventamos. Não percebemos que, tendo inventado Deus, imediatamente nos escravizamos a ele."
(morreu nesta sexta-feira, de falência múltipla dos órgãos.Este sim, o seu ponto final)
sexta-feira, 18 de junho de 2010
É o que tem de ser!
*** Você valeu cada segundo da minha espera dos meus quase 40 anos. Mas como eu não sabia que você viria, eu me desesperei, entrei em prantos muitas vezes, lamentando esse Deus injusto que não forneceu o meu outro eu. E eu tentava fazer as coisas acontecerem. Na pressa, eu acelerava relações efêmeras que terminavam num piscar de olhos. Na ânsia, eu me iludia que gostava para não ficar pagando o pato por carência. Tantas vezes ouvi a referida frase: calma, na hora certa tudo acontece" que fiquei receosa dela. Na verdade, cética. E quando aconteceu, foi como a explosão de uma estrela. Não encontrei explicações de o porquê você se ligou em mim. Não entendi o que foi que te cativou. Alias jamais entendi o motivo pelo qual te encontrei solitário, querendo alguém, sendo que tu é PPA (parceiro potencialmente atraente). Mas então agora eu creio ter entendido a tão propalada frase sobre os acontecimentos: o que tem de ser, será. A gente planeja, Deus ri e faz do jeito dele, na engrenagem do tempo que gira de acordo com seu relógio. E tudo o que eu tenho no meu peito é uma vontade contida de chorar, porque um dia eu duvidei desse relojoeiro. Mas essa vontade de verter lágrimas vem pelo fato de estar plena desse encontro: quatro décadas a espera. Muitas vezes, cabisbaixa, eu observava outros casais e a inveja pulsava como uma navalha que fere a carne. Mas então simplesmente aconteceu, como tudo o que é simples, como tudo o que deve acontecer. E eu percebi que a mão divina faz uma força imensa a nosso favor.
******
Jogue suas mãos para o céu e agradeça se acaso tiver alguém que você gostaria que estivesse sempre com você... se não... não faça nada!O acaso constrói, a inércia destrói... não fazer nada é tão errado quanto fazer tudo pra forçar uma situação. A única coisa que sabemos é que quando tem que acontecer... acontece! (retirado do Orkut)
************
Colocar a razão acima das emoções não é tarefa fácil. É como tentar esmagar a lama, as vezes ela cobre seus pés. (Adeus, Eros)
******
Jogue suas mãos para o céu e agradeça se acaso tiver alguém que você gostaria que estivesse sempre com você... se não... não faça nada!O acaso constrói, a inércia destrói... não fazer nada é tão errado quanto fazer tudo pra forçar uma situação. A única coisa que sabemos é que quando tem que acontecer... acontece! (retirado do Orkut)
************
Colocar a razão acima das emoções não é tarefa fácil. É como tentar esmagar a lama, as vezes ela cobre seus pés. (Adeus, Eros)
Eu amo esse texto, não sei se é realmente de Arthur da Távola, mas as palavras servem bem para o meu momento. Mas sim, eu creio que cada encontro está carregado de perda. Quando a gente tem um encontro feliz, inevitavelmente associaremos a ele, a ideia de que tudo passa. E como a vida é fugaz, este instante também o será. Há saudade embutida em cada encontro. Há o amor, que carece de zilhões de encontros. (O texto é bem mais logo, só postei os trechos que mais me comovem. Eu choro lendo esse texto)
"Cada encontro está carregado da perda, ou de perdas. A perda é mais adivinhada do que sentida. E no ato de sentir-se feliz, intensamente feliz, associa-se a idéias do passageiro que é tudo, do amanhã cheio de interrogações, da exceção que aquilo significa. E uma tristeza muito particular se instala: a tristeza feliz. É a que se associa ao momento bom, como a perda inerente a cada encontro, como sentimento de certeza de que tudo aquilo passará… Quem se alegra demais se distancia da felicidade. Eu diria que a alegria não é felicidade, e que a felicidade, muitas vezes, está mais perto da tristeza do que da alegria. Felicidade está mais perto da tristeza, porque a certeza da perda sempre se instala a cada vez em que estamos felizes. Cada encontro está carregado de perda. Nesta vida. E até na outra, que se existe (e permitirá o encontro redentor), precisou da perda desta vida. E esta certeza – a da perda – a que provoca aquela lágrima ou aquela angústia, que a gente não sabe porque às vezes se instala após os verdadeiros encontros. Há sempre uma despedida em cada alegria. Há sempre um ‘e depois’, após cada felicidade. Há sempre uma saudade na hora de cada encontro. Antecipada."
"Cada encontro está carregado da perda, ou de perdas. A perda é mais adivinhada do que sentida. E no ato de sentir-se feliz, intensamente feliz, associa-se a idéias do passageiro que é tudo, do amanhã cheio de interrogações, da exceção que aquilo significa. E uma tristeza muito particular se instala: a tristeza feliz. É a que se associa ao momento bom, como a perda inerente a cada encontro, como sentimento de certeza de que tudo aquilo passará… Quem se alegra demais se distancia da felicidade. Eu diria que a alegria não é felicidade, e que a felicidade, muitas vezes, está mais perto da tristeza do que da alegria. Felicidade está mais perto da tristeza, porque a certeza da perda sempre se instala a cada vez em que estamos felizes. Cada encontro está carregado de perda. Nesta vida. E até na outra, que se existe (e permitirá o encontro redentor), precisou da perda desta vida. E esta certeza – a da perda – a que provoca aquela lágrima ou aquela angústia, que a gente não sabe porque às vezes se instala após os verdadeiros encontros. Há sempre uma despedida em cada alegria. Há sempre um ‘e depois’, após cada felicidade. Há sempre uma saudade na hora de cada encontro. Antecipada."
Algum dia em qualquer parte, em qualquer lugar indefectivelmente te encontrarás a ti mesmo, e essa, só essa, pode ser a mais feliz ou a mais amarga de tuas horas."
( Pablo Neruda)
( Pablo Neruda)
quinta-feira, 17 de junho de 2010
Coração Galopante
Sou um estardalhaço de existir, só para citar Clarice Lispector. É incrível como um sentimento pode invadir com tanto ímpeto a alma, o corpo e a mente. Estou num pavor galopante, que se eleva aos píncaros, dobrou a curva e vem descendo.
Schopenhauer, o filósofo da melancolia salienta que o homem e a vida estão fadados ao fracasso. Porque o homem deseja e todo desejo uma vez satisfeito vira um outro desejo. E assim o ciclo não para é igual a samsara, a roda dos desejos budistas.
Mas eu sei bem que estou caminhando em uma corda bamba. Estou me sentindo mais vulnerável do que nunca, na dependência desse súbito e feroz sentimento.
Assim como me torno eufórica neste instante, noutro posso me corroer de aflição. Que angústia mordaz. É a instabilidade provocada por esse prazer - prazer bom e ruim - que me remete a um estado de embriaguez. Tenho em mim todos os sonhos românticos do mundo, mas acompanhados de um alto teor etílico.
Baudelaire exortou seus leitores a se embriagarem. "Para não sentirdes o terrível fardo do tempo que vos abate e vos empurra para o chão, embriagai-vos incessantemente."
Eu pareço tomar grandes picos de anfetamina. Meu centro da fome não acusa mais que é hora de comer, passo o dia sem me alimentar. E da mesma forma, a noite eu não durmo. Sou capaz de conversar comigo por horas e horas imaginando diálogos, fazendo perguntas, construindo situações e lembrando detalhes de conversas. Eu passo tim tim por tim tim tudo o que foi dito e me vem um estado febril de euforia como se a jovem adolescente que eu fora voltasse a encarnar em mim. Eu busco me policiar. Mas a insensatez virou me destino. Sei que quanto maior a altura, maior o tombo. Esse sentimento de felicidade me invade, mas assim também sera retumbante a tristeza, que virá na epoca propícia.. O meu coração se rasga de medo. Palpita num descompasso acelderadíssimo. Estou sempre na expectativa de que algo vai acontecer por conta dessa sensação que me abocanhou e soca a boca do estômago. E se porventura fico saciada do desejo nessa hora, na próxima quero mais. É algo que preciso regar todos os minutos das 24 horas. Uma sensação inflamável, incômoda que nem urtiga. Me amedronto com o que vai ser de mim. Esse medo me amordaça o estômago. Azeda o meu feijão. Me deixa a beira do penhasco. Só porque eu ouso voar a seis mil pés de altura.Mas eu não tenho asas. Só um coração que anda a galope.
Schopenhauer, o filósofo da melancolia salienta que o homem e a vida estão fadados ao fracasso. Porque o homem deseja e todo desejo uma vez satisfeito vira um outro desejo. E assim o ciclo não para é igual a samsara, a roda dos desejos budistas.
Mas eu sei bem que estou caminhando em uma corda bamba. Estou me sentindo mais vulnerável do que nunca, na dependência desse súbito e feroz sentimento.
Assim como me torno eufórica neste instante, noutro posso me corroer de aflição. Que angústia mordaz. É a instabilidade provocada por esse prazer - prazer bom e ruim - que me remete a um estado de embriaguez. Tenho em mim todos os sonhos românticos do mundo, mas acompanhados de um alto teor etílico.
Baudelaire exortou seus leitores a se embriagarem. "Para não sentirdes o terrível fardo do tempo que vos abate e vos empurra para o chão, embriagai-vos incessantemente."
Eu pareço tomar grandes picos de anfetamina. Meu centro da fome não acusa mais que é hora de comer, passo o dia sem me alimentar. E da mesma forma, a noite eu não durmo. Sou capaz de conversar comigo por horas e horas imaginando diálogos, fazendo perguntas, construindo situações e lembrando detalhes de conversas. Eu passo tim tim por tim tim tudo o que foi dito e me vem um estado febril de euforia como se a jovem adolescente que eu fora voltasse a encarnar em mim. Eu busco me policiar. Mas a insensatez virou me destino. Sei que quanto maior a altura, maior o tombo. Esse sentimento de felicidade me invade, mas assim também sera retumbante a tristeza, que virá na epoca propícia.. O meu coração se rasga de medo. Palpita num descompasso acelderadíssimo. Estou sempre na expectativa de que algo vai acontecer por conta dessa sensação que me abocanhou e soca a boca do estômago. E se porventura fico saciada do desejo nessa hora, na próxima quero mais. É algo que preciso regar todos os minutos das 24 horas. Uma sensação inflamável, incômoda que nem urtiga. Me amedronto com o que vai ser de mim. Esse medo me amordaça o estômago. Azeda o meu feijão. Me deixa a beira do penhasco. Só porque eu ouso voar a seis mil pés de altura.Mas eu não tenho asas. Só um coração que anda a galope.
quarta-feira, 16 de junho de 2010
O fosso
O desejo nasce e com ele, a vontade que feneceu. Somos assim, queremos sempre mais. Porque um desejo depois de satisfeito não é mais desejo, vira descarte. Por isso Buda disse que aqui é maia, o mundo das ilusões. Schopenhauer também pensava parecido. Dizia que o mundo é uma ilusão e não devemos nos preocupar com ele, e sim repudiá-lo. Ando pensando muito nisso porque meus desejos estão latentes. Eu faço força para contrariá-los mas eles vêm em uma explosão de sentimentos dificil de acorrentá-los. Fico apavorada com minha falta de domínio. Descobri que o amor é um poço sem fundo. Você fala, fala com a pessoa. Fica horas confabulando ladainhas, coisas desinteressantes, pelo simples fato de estar aí com ela. E cinco minutos depois, você já sente falta dela e quer tudo de novo. Parece um fosso, tudo se esvai em questão de minutos e você fica precisando eternamente desse zelo. É um buraco negro que se agiganta no peito quando você fica mais do que, cinco horas sem ter contato com ela. Tudo culpa do circuito cerebral. Se eu fosse budista, poderia tentar domar isso, mas como não sou, fico procurando referencias de Schopenhauer para conseguir dar ordem nessa balbúrdia interna. Queria que a paz deitasse sobre mim e viesse com um amor terno, diligente e sereno.
*** A visão de mundo de Schopenauer é profundamente pessimista. Para ele, somos escravos de nossos desejos. Mal satisfazemos um e outro surge, de modo que vivemos permanentemente insatisfeitos. Além disso, o mundo está repleto de injustiça e violência. A existência é, assim, uma fonte de sofrimentos."Cada vida individual é uma tragédia insignificante que termina numa morte inevitável"
------------------------------
O desejo e a posse
Um homem não se sente totalmente privado dos bens aos quais nunca sonhou aspirar, mas fica muito satisfeito mesmo sem eles, enquanto outro que possua cem vezes mais do que o primeiro sente-se infeliz quando lhe falta uma única coisa que tenha desejado. A esse respeito, cada um tem também um horizonte próprio daquilo que lhe é possível atingir, e as suas pretensões têm uma extensão semelhante a esse horizonte. Quando determinado objecto, situado dentro desses limites, se lhe apresenta de modo que o faça acreditar na possibilidade de alcançá-lo, o homem sente-se feliz; em contrapartida, sentir-se-à infleliz quando eventuais dificuldades lhe tirarem tal possibilidade. Tudo o que estiver situado externamente a esse campo visual não agirá de forma alguma sobre ele. Por esse motivo, as grandes propriedades dos ricos não perturbam o pobre, e, por outro lado, para o rico cujos propósitos tenham fracassado, serve de consolo as muitas coisas que já possui. (A riqueza assemelha-se à água do mar; quanto mais dela se bebe, mais sede se tem. O mesmo vale para a glória).
(Arthur Schopenhauer, in 'A Arte de Ser Feliz')
-----------------------------
Na tenebrosa visão de Schopenhauer, o desejo é como que a semente de todo o sofrimento (e nesse ponto, como em muitos outros, ele se aproxima muito do budismo). Nâo há nenhum sofrimento que não seja frustração de um desejo ou demora na satisfação de um desejo. Somos infelizes pois a vida não é como desejamos que seja. Simples assim. Se conseguíssemos desejar que a vida fosse exatamente como é, se conseguíssemos deixar de querer que ela seja algo de diferente, algo de aperfeiçoado, algo de melhor, não estaríamos enfim reconciliados com ela?
Mas, dirão alguns, pretendendo refutar o sombrio alemão, que nem todo desejo é impossível de satisfazer, e que é inegável a existência do prazer quando conquistamos o objeto dos nossos desejos. Sem dúvida que é assim. Schopenhauer não nega. Negar a existência do prazer seria ridículo de um filósofo dessa categoria. O problema, claro, é que o prazer não dura. Todo desejo satisfeito nos causa um pequeno momento de prazer, o rápido fulgor subjetivo da alegria, um pequeno brilho na escuridão do sofrimento, mas logo ele, o prazer, destrói o desejo que o precedeu, e então o que sobra?... O tédio, o aborrecimento, o enfado. O prazer é o carrasco do desejo. E morto um desejo, assassinado pelo prazer, corre a nos dominar um novo desejo, e assim segue a vida, nessa “constante marcha adiante do desejo”, como diz Hobbes. O prazer é como um aliviante balde d’água que se despeja sobre o fogo do desejo. E, apagado o fogo, infelizmente, não é o repouso que se encontra: das cinzas renasce, como Fênix, um novo desejo. E saímos então, mundo afora, à caça de numerosos baldes d’água para apagar fogos que se sucedem numa fila sem fim, bombeiros no incêndio do desejo...
*** A visão de mundo de Schopenauer é profundamente pessimista. Para ele, somos escravos de nossos desejos. Mal satisfazemos um e outro surge, de modo que vivemos permanentemente insatisfeitos. Além disso, o mundo está repleto de injustiça e violência. A existência é, assim, uma fonte de sofrimentos."Cada vida individual é uma tragédia insignificante que termina numa morte inevitável"
------------------------------
O desejo e a posse
Um homem não se sente totalmente privado dos bens aos quais nunca sonhou aspirar, mas fica muito satisfeito mesmo sem eles, enquanto outro que possua cem vezes mais do que o primeiro sente-se infeliz quando lhe falta uma única coisa que tenha desejado. A esse respeito, cada um tem também um horizonte próprio daquilo que lhe é possível atingir, e as suas pretensões têm uma extensão semelhante a esse horizonte. Quando determinado objecto, situado dentro desses limites, se lhe apresenta de modo que o faça acreditar na possibilidade de alcançá-lo, o homem sente-se feliz; em contrapartida, sentir-se-à infleliz quando eventuais dificuldades lhe tirarem tal possibilidade. Tudo o que estiver situado externamente a esse campo visual não agirá de forma alguma sobre ele. Por esse motivo, as grandes propriedades dos ricos não perturbam o pobre, e, por outro lado, para o rico cujos propósitos tenham fracassado, serve de consolo as muitas coisas que já possui. (A riqueza assemelha-se à água do mar; quanto mais dela se bebe, mais sede se tem. O mesmo vale para a glória).
(Arthur Schopenhauer, in 'A Arte de Ser Feliz')
-----------------------------
Na tenebrosa visão de Schopenhauer, o desejo é como que a semente de todo o sofrimento (e nesse ponto, como em muitos outros, ele se aproxima muito do budismo). Nâo há nenhum sofrimento que não seja frustração de um desejo ou demora na satisfação de um desejo. Somos infelizes pois a vida não é como desejamos que seja. Simples assim. Se conseguíssemos desejar que a vida fosse exatamente como é, se conseguíssemos deixar de querer que ela seja algo de diferente, algo de aperfeiçoado, algo de melhor, não estaríamos enfim reconciliados com ela?
Mas, dirão alguns, pretendendo refutar o sombrio alemão, que nem todo desejo é impossível de satisfazer, e que é inegável a existência do prazer quando conquistamos o objeto dos nossos desejos. Sem dúvida que é assim. Schopenhauer não nega. Negar a existência do prazer seria ridículo de um filósofo dessa categoria. O problema, claro, é que o prazer não dura. Todo desejo satisfeito nos causa um pequeno momento de prazer, o rápido fulgor subjetivo da alegria, um pequeno brilho na escuridão do sofrimento, mas logo ele, o prazer, destrói o desejo que o precedeu, e então o que sobra?... O tédio, o aborrecimento, o enfado. O prazer é o carrasco do desejo. E morto um desejo, assassinado pelo prazer, corre a nos dominar um novo desejo, e assim segue a vida, nessa “constante marcha adiante do desejo”, como diz Hobbes. O prazer é como um aliviante balde d’água que se despeja sobre o fogo do desejo. E, apagado o fogo, infelizmente, não é o repouso que se encontra: das cinzas renasce, como Fênix, um novo desejo. E saímos então, mundo afora, à caça de numerosos baldes d’água para apagar fogos que se sucedem numa fila sem fim, bombeiros no incêndio do desejo...
terça-feira, 15 de junho de 2010
Colo
"Eu me dou melhor comigo mesma quando estou infeliz:há um encontro. Quando me sinto feliz, parece-me que sou outra"
Lispector sempre teve o maior talento com as palavras e em várias frases suas eu identifico-me. Não saberia como costurar tão bem as frases. Na felicidade, eu tenho medo do próximo instante que pode não ser mais feliz. Eu tenho medo de me acostumar a felicidade e depois ter de chorar para voltar aos doces campos inócuos, onde nem alegria, nem melacolia se criam. Eu sinto essa agonia estapafúrdia que não quer parar de palpitar no meu peito. Me amedronta o que ela vai fazer comigo. Vai engolir um por um meus largos pensamentos a respeito da alegria, vai retirar com a pinça minhas ideias de ir avante. Vai solapar minha vontade de me sentir viva. Tenho medo de me iludir com a felicidade. Quero me olhar na poça da água e sentir que este é o riso real, aquele opaco refletido no chão, sem presunção de grandes alturas. Deus, cansei de andar de roda-gigante da felicidade. Prefiro o chão, a terra firme e um sentimento estabilizador, porque é com eles que sei lidar. Prefiro Deus, que tu me nine com tuas canções de ninar e me acolha no colo como uma garotinha que necessita de segurança. É este todo conforto que eu quero. Quero o aconchego de um colo mais do que a escalada para a felicidade. Um colo humano, também tá valendo.
Lispector sempre teve o maior talento com as palavras e em várias frases suas eu identifico-me. Não saberia como costurar tão bem as frases. Na felicidade, eu tenho medo do próximo instante que pode não ser mais feliz. Eu tenho medo de me acostumar a felicidade e depois ter de chorar para voltar aos doces campos inócuos, onde nem alegria, nem melacolia se criam. Eu sinto essa agonia estapafúrdia que não quer parar de palpitar no meu peito. Me amedronta o que ela vai fazer comigo. Vai engolir um por um meus largos pensamentos a respeito da alegria, vai retirar com a pinça minhas ideias de ir avante. Vai solapar minha vontade de me sentir viva. Tenho medo de me iludir com a felicidade. Quero me olhar na poça da água e sentir que este é o riso real, aquele opaco refletido no chão, sem presunção de grandes alturas. Deus, cansei de andar de roda-gigante da felicidade. Prefiro o chão, a terra firme e um sentimento estabilizador, porque é com eles que sei lidar. Prefiro Deus, que tu me nine com tuas canções de ninar e me acolha no colo como uma garotinha que necessita de segurança. É este todo conforto que eu quero. Quero o aconchego de um colo mais do que a escalada para a felicidade. Um colo humano, também tá valendo.
sexta-feira, 11 de junho de 2010
Vuvuzelas nos meus olhos!

Ando aturida. Não sei de que forma, mas a alegria está atirando pedrinhas na minha janela. Escuto o sibilar dos canários e a Terra me parece mais azul do que a do Iuri Gagarin. O frio me açoita a pele branca e eu perco a mobilidade em função do acúmulo de casacos. Mas não é porque esses pagos verdejantes se cobrem de geada que eu deixo de sorrir de um canto a outro da boca, mostrando o metal que emoldura meus dentes. É bem apropriado esse aparelho ortodôntico à beira dos 40. Eu estou esfuziante igual a uma adolescente. Não me perguntem que bicho me mordeu. Mas tem a ver com adrenalina, noradrenalina, feniletilamina, dopamina, oxitocina, serotonina e as endorfinas. Quem for antenado sacou que se relaciona a uma reação química.
No jornal, costumo ser a Dona Reclamona. Não pago pedágio para largar um "Ah, que saco", ou outra coisa que o valha. O pessoal já se acostumou. Bem, alguns não e confesso que minha "distimia" pega de jeito certos colegas. Eu me queixo por hábito, não é nem que está tão ruim assim, mas o ranço sai maquinalmente da minha boca. Mas tem três dias que estou melhorzinha. Estar contente não é nenhuma descoberta da América, mas no meu caso tem uma conotação especial. Sempre tive medo de ser feliz. Medo de atingir um ponto de contentamento e depois ter de voltar a submergir na tristeza. A melancolia sempre foi minha zona de conforto, sendo assim, relutava em sair dela. Mas dessa vez eu fugi das garras da dita cuja e sabe o quê? Eu não estou com um pingo de temor. Ando me surpreendendo com esses sentimentos. Sim, eu descobri a África em plena Copa do Mundo. Estou vendo vuvuzelas orbitando ao redor dos meus olhos. Este vai ser o meu Mundial, ando de marcação cerrada com a alegria. E não tem impedimento que ataque os melhores lances desse meu frenesi. Quero a vida em jogo para desempatar qualquer drible infeliz.
No jornal, costumo ser a Dona Reclamona. Não pago pedágio para largar um "Ah, que saco", ou outra coisa que o valha. O pessoal já se acostumou. Bem, alguns não e confesso que minha "distimia" pega de jeito certos colegas. Eu me queixo por hábito, não é nem que está tão ruim assim, mas o ranço sai maquinalmente da minha boca. Mas tem três dias que estou melhorzinha. Estar contente não é nenhuma descoberta da América, mas no meu caso tem uma conotação especial. Sempre tive medo de ser feliz. Medo de atingir um ponto de contentamento e depois ter de voltar a submergir na tristeza. A melancolia sempre foi minha zona de conforto, sendo assim, relutava em sair dela. Mas dessa vez eu fugi das garras da dita cuja e sabe o quê? Eu não estou com um pingo de temor. Ando me surpreendendo com esses sentimentos. Sim, eu descobri a África em plena Copa do Mundo. Estou vendo vuvuzelas orbitando ao redor dos meus olhos. Este vai ser o meu Mundial, ando de marcação cerrada com a alegria. E não tem impedimento que ataque os melhores lances desse meu frenesi. Quero a vida em jogo para desempatar qualquer drible infeliz.
-------------------------------------------------------------------------------------------------
*** "Mas tenho medo do que é novo e tenho medo de viver o que não entendo - quero sempre ter a garantia de pelo menos estar pensando que entendo, não sei me entregar à desorientação".
(Clarice Lispector)
*** Conservo sempre uma aspa à esquerda e a direita de mim (Clarice Lispector)
***Eu tenho medo do instante que é sempre único."[Clarice Lispector]
***"Quando estou feliz demais, sinto uma angústia amordaçante: assusto-me."[Clarice Lispector]
quinta-feira, 3 de junho de 2010
Mais de mim
Hoje o dia tem um sol lindo, parece que se abriu para inalar as festividades de Corpus Christi que replicam pela região. Esses raios solares não me atingem. Parece que nasci com um escudo contra a felicidade. Alma privada de luz, envolta em uma manta sombria de ideias que não me levam a lugar nenhum. Um amigo meu me disse, há dois anos que eu era uma errante. Tal lucidez ante essa estapafúrida constação na época me chocou. Mas eu retive a informação e concordo com ele. Deixamos de nos falar, eu e ele, mas se pudesse, lhe diria que ele tinha razão. E sempre que eu penso na palavra errante, lembro da sua presença centrada e decidida, nada do que eu sou.
Esta semana eu fui ao psiquiatra. Vou lá para manter a medicação e avaliar se eu preciso aumentar a dose ou trocar os fármacos. Tomo antidepreessivo e estabilizadores de humor. Sempre pendemos nossa conversa para um viés filosófico, en passant, ele fala de Marcel Proust, eu emendo com a teoria do "eterno retorno" de Nietzsche. Ele diz que são poucas as mulheres com as quais se pode falar sobre isso e aproveita para me elogiar: "Viu como você tem qualidades". Mas eu não engulo esse louvores pessoais. E ele então ressalta: "quando você começa a se criticar, sai de baixo".
Eu não sei o que esperar da vida. Não sei o que ela quer de mim. Eu estou com uma certa idade, quase quarenta anos rodando na face da Terra. Eu não construi nada em minha vida. Eu, com um sopro de inspiração, consigo escrever histórias bonitas de outras pessoas para estampar nas páginas de jornais. Eu sou volúvel, cheia de dúvidas, indecisa, um certo egoísmo que não me larga. Eu penso em budismo e leio sobre o assunto para me tornar melhor. Todas as segundas-ferias, eu vou ao Centro Espírita e saio de lá com o firme propósito de ser mais caridosa. Essa semana também aprendi o significado da palavra "alteridade". Gostei, refleti sobre. Alteridade é a capacidade de se colocar no lugar do outro. Se fizéssemos esse exercício com certeza desenvolveriamos a tolerância e a benevolência.
Eu estou escrevendo tudo isso para dizer que não me acho boa como pessoa. E talvez por isso, as coisas boas não cheguem até mim. Eu considero o amor um dos episódios mais auspiciosos na vida de uma pessoa. Eu sinto vergonha de não ter um. Eu me sinto desamparada. Ser solteira às vésperas dos 40 anos é ratificar o fracasso pessoal. Sim, eu me cobro, eu me sinto excluída dos universo dos pares. Na cabeça das pessoas, deve passar o questionamento: "algum problema ele deve ter para estar sozinha". A solidão mutila. Ela te arranca uma por uma as esperanças, cada vez que um relacionamento não dá certo. Estar banido do mundo dos pares, para mim é a pior exclusão. E quando eu me olho no espelho, eu vejo uma mulher amputada sentimentalmente.
Esta semana eu fui ao psiquiatra. Vou lá para manter a medicação e avaliar se eu preciso aumentar a dose ou trocar os fármacos. Tomo antidepreessivo e estabilizadores de humor. Sempre pendemos nossa conversa para um viés filosófico, en passant, ele fala de Marcel Proust, eu emendo com a teoria do "eterno retorno" de Nietzsche. Ele diz que são poucas as mulheres com as quais se pode falar sobre isso e aproveita para me elogiar: "Viu como você tem qualidades". Mas eu não engulo esse louvores pessoais. E ele então ressalta: "quando você começa a se criticar, sai de baixo".
Eu não sei o que esperar da vida. Não sei o que ela quer de mim. Eu estou com uma certa idade, quase quarenta anos rodando na face da Terra. Eu não construi nada em minha vida. Eu, com um sopro de inspiração, consigo escrever histórias bonitas de outras pessoas para estampar nas páginas de jornais. Eu sou volúvel, cheia de dúvidas, indecisa, um certo egoísmo que não me larga. Eu penso em budismo e leio sobre o assunto para me tornar melhor. Todas as segundas-ferias, eu vou ao Centro Espírita e saio de lá com o firme propósito de ser mais caridosa. Essa semana também aprendi o significado da palavra "alteridade". Gostei, refleti sobre. Alteridade é a capacidade de se colocar no lugar do outro. Se fizéssemos esse exercício com certeza desenvolveriamos a tolerância e a benevolência.
Eu estou escrevendo tudo isso para dizer que não me acho boa como pessoa. E talvez por isso, as coisas boas não cheguem até mim. Eu considero o amor um dos episódios mais auspiciosos na vida de uma pessoa. Eu sinto vergonha de não ter um. Eu me sinto desamparada. Ser solteira às vésperas dos 40 anos é ratificar o fracasso pessoal. Sim, eu me cobro, eu me sinto excluída dos universo dos pares. Na cabeça das pessoas, deve passar o questionamento: "algum problema ele deve ter para estar sozinha". A solidão mutila. Ela te arranca uma por uma as esperanças, cada vez que um relacionamento não dá certo. Estar banido do mundo dos pares, para mim é a pior exclusão. E quando eu me olho no espelho, eu vejo uma mulher amputada sentimentalmente.
Assinar:
Postagens (Atom)