segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Cordeiro excluído

Antes de descer, corpo é negado quatro vezes

Família de vítima vai à Justiça para transferir morto ao cemitério católico. Empresário foi separado do túmulo da companheira por ser luterano


Poço das Antas - O corpo de um cristão, um dilema religioso e a imprensa em cima. O caso passaria em branco não houvesse sucessão de coincidências para dar holofote ao sepultamento de Irineu Wasen, sexagenário que na hora da morte sentiu a rejeição de não estar no rebanho certo. Pelo menos no momento derradeiro.
Vítima de um acidente na BR-386, morreu durante o Feriado de Finados. O episódio vitimou ainda sua companheira Eunice Ely e a sogra Carmelita Ely. Pelo número de mortos, a tragédia recebeu atenção dos veículos de comunicação. Mas foi o funeral que causou repercussão. Irineu foi rejeitado quatro vezes. A luta para enterrar o morto foi angustiante e cansativa, relata sua irmã, Ana Lisete Windberg

Irineu Wasen era luterano e morava na capital. Mantinha em dia a mensalidade da congregação em Porto Alegre. Uma série de fatores o tornou “excluído” do rebanho divino. Inicialmente, desejavam enterrá-lo junto à mulher e a sogra no cemitério católico em Poço das Antas. Os familiares tiveram de bater em cinco “portas” até que ele fosse sepultado.

Em busca do “campo santo”

Na primeira vez em Poço das Antas, o padre negou por Irineu não ser católico. Na segunda vez, novamente em Poço das Antas , foi recusado pelo pastor por não fazer parte da congregação.

Na terceira vez, familiares dizem que Irineu foi negado pelo prefeito de Teutônia. Por não ser do município. Logo depois, teria aceitado autorizar o enterro diante da liberação do Ministério Público. Desta vez, teria sido a promotoria a engrossar o impasse.“A promotoria não autorizou alegando que ele não era munícipe”, conta a irmã do empresário, Ana Lisete Windberg, que mora e trabalha em Teutônia.

A quinta porta de Deus foi aberta e o empresário conseguiu ser sepultado: no cemitério evangélico em Linha Clara, interior de Teutônia, junto aos avós. A negociação do enterro teve o auxílio do presidente da comunidade Ariberto Magedanz “Conseguimos a autorização ao meio-dia de quinta-feira”, frisa Ana.“Foi desgastante e até humilhante, passamos a madrugada ligando e negociando”. Às 14h, o caixão do empresário foi colocado no jazigo dos ancestrais.

Na Justiça

Os parentes velaram os mortos absorvidos pelo desgaste de um dilema religioso. Ontem, algumas horas após o funeral, se mostraram indignados e vão levar o assunto adiante. Ana diz que vão procurar a Justiça para sepultar o irmão no cemitério católico, junto com companheira com a qual viveu durante 25 anos.“Eles se conhecem desde pequenos. Uma vida toda juntos e agora estão separados.” Segundo Ana, o casal acreditava na vida eterna e buscava isso na religião. “ Eles era muito religiosos, praticavam o bem e eram pessoas do bem. Pagam seus impostos como um brasileiro, honestos, e agora nesse momento de requerer um direito que a própria constituição lhes dá é negado.” Ana está inconformada pela separação em morte do pai e sua companheira. “Deus não é um só para todos?”


Para Bispo houve “falta de experiência”

O bispo emérito da diocese de Santa Cruz do Sul, Dom Sinésio Bohn, opina que a recusa tanto de padre quanto de pastor tenha sido ausência de experiência. “Falta de treinamento com a sociedade pluralista.”

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