Indicada por um colega, leio uma matéria fantástica que saiu na Zero Hora neste final de semana. Com um texto desenhado em palavras e frases indefectíveis, Ricardo Stefanelli, diretor de redação da ZH relata o reencontro com Tatiane, uma ex-interna da Febem que fora notícia ha 18 anos sob a manchete: "As crianças que ninguém quer". Tatiane morava na ala que era considerada o "ferro velho" da instituição, porque estas eram crianças rejeitadas por serem mais velhas ou negras. Stefanelli revolveu a história e foi buscar sua velha amiga, que na época, de tanta atenção que queria, enroscava-se em suas pernas. Hoje, mulher feita, 25 anos, com um marido e nos planos, um filho para o futuro, Tatiane é protagonista de uma nova versão da sua vida: com sonhos e esperanças que se concretizaram. A menina de tiara que sorria se transformou em uma jovem esposa de largo sorriso, cuja trajetória foi salva por uma adoção: um ato de afeto da professora Rosemari Faleiro.
Esse preâmbulo todo foi para me referir ao título da reportagem recente: A menina que sorria. Tatiane conseguiu vencer a rejeição e descartar os vestígos de um passado não venturoso. Emerge com planos que vão ser costurados a dois, quem sabe a três, quando o filho que ainda não está no ventre nascer.
Eu me comparei. Vi que tive muito mais do que ela. Vi que tenho muito menos. Me sinto roubada. Sequestraram meus sonhos. Por Deus, ou eu os matei. Todos. Não sobrou um para contar história. Não tenho desejo de fazer família. Adormeci a ideia de cativar um namorado. Não me atiça o gosto por subir degraus no meu trabalho. Não me assanha nenhum tipo de desejo. Sou uma mulher ausente e autômata. Liguei o piloto automático e vou sobrevivendo. Mas, como esclarece Osho, sobrevivência não é vida.
Talvez meus sonhos estejam sepultados nos porões da mente. Talvez trezentas sessões de psicanálise os façam vir à tona. Não sei como vai acabar a minha história. Uma trajetória insossa, mas um caminho que é o meu. Pelos céus, eu queria que esse meu caminho valesse ao menos um bom sonho, com perspectiva de realização.
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