Uma vez por ano, a mão brasileira dos governantes tem a audácia de mexer no tempo. Como se fosse A Mão Que Tudo Fez. Como se os ponteiros do relógio pudessem pontificar a hora certa para sairmos para a rua, recebermos a claridade do sol. Ah, se bastasse um ajuste dos ponteiros para ficarmos quites com o relógio biológico. Ah, se conseguíssemos domar a areia da ampulheta. Aproveito o horário de verão para pensar por metáforas, hábito com o qual me deleito antes, durante e depois de qualquer hora, pois o tempo, de fato não tem horário. É só uma convenção humana para distribuir melhor as tarefas na rotina cotidiana. Assim, fatiamos o tempo em partes infinitesimais de modo que um piloto de fórmula 1 possa se tornar consagrado por ter sido dois milésimos de segundo mais rápido do que o segundo colocado. Ou ainda, de modo que a cada três meses as estações do ano possam se renovar, num ato improvisado da natureza. O filósofo André Comte-Sponville, que é justamente por causa do que torna a natureza sempre nova que ela só inova raramente."Porque o que dura ou se repete só ocorre mudando, e nada começa que não deva acabar.” Lindo.
O jornalista gaúcho Nei Duclós sentencia que o tempo é a metáfora do mundo quando se comporta como um pêndulo. E eu vivencio a duras penas que, conforme o pêndulo balança, nos tornamos mais velhos. Começamos a morrer logo que nascemos e só nos damos conta da brevidade da vida após os 40 anos. Quem sabe a idade do lobo também seja a idade da consciência do tempo. Foi na definição de Jostein Gaarder, lendo O Dia do Curinga, que me encaixei com o tempo, senhor que engole todas as nossas dores e aplaina as feridas: “ O tempo mastiga, mastiga e somos nós quem estamos no meio dos seus dentes.” Mas vejam bem, o ruim de envelhecer é que a gente fica obrigado a amadurecer. Como se as coisas que a gente aprendeu e doeu durante a vida, fossem impelidas de não mais acontecerem, afinal, pressupõe-se que se a gente não aprende pelo amor, aprende pela dor. E se eu não aprender com nenhum dos dois? Tem certas coisas que são inestimáveis, tem certo erros que são domésticos, de estimação, acontecem sempre. A maturidade é um álibi frágil. Não uso ela como meio de defesa para provar que a tenho. Eu nem tenho, eu só avanço em anos, mas não atinjo a ponderação. Eu só matuto sobre maturar, mas continuo na creche à beira da meia idade. E no final das contas, se tem algo com o qual concordo, é com o legendário Raul Seixas: o Universo me espanta e não posso imaginar que esse relógio exista e não tenha um relojoeiro.” Em todo caso, ajuste seu relógio com o horário brasileiro de verão e dê uma olhada na sua conta de luz: ela deve vir mais baixa, porque até fevereiro, vc vai ajudar o Brasil a economizar 5% da energia. Mas não poupe energia na sua vida.
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