quinta-feira, 14 de outubro de 2010

O buraco de nossas vidas

Acabou, acabou. Emergem os 33 mineiros enterrados durante dois meses no deserto do Atacama. Adentraram 700 metros na terra e viveram como animaizinhos durante longos 69 dias. A cobertura foi um espetáculo midiático, embora eu não condene isso. Creio que,graças a mídia, o governo chileno tratou de acelerar as condições para o resgate. Tecnologia de ponta, familiares em volta dando apoio e uma profusão de repórteres querendo fazer bonito na pauta de suas vidas. Só para ter uma ideia de como os mineiros suplantaram outras notícias, em 26 milésimos de segundos o Onipresente Google registra aproximadamente dez milhões de páginas com a palavra "mineiros". Ao virem à tona, eles pediram "não nos tratem como artistas". Impossível, a busca por uma exclusiva era tanta que jornais teriam oferecidos 32 mil euros em troca de declarações. Reflito cá com meus botões: 32 mil mais 10 mil dólares ofertados a cada um por um magnata grego, eu também enfrentaria o buraco. Se bem que é fácil pensar que enfrentaríamos tragédias quando estamos ao final delas.
A mina de Copiapó virou o legítimo BBB da Sobrevivência. Mais de dois mil jornalistas se entrincheiraram para dar a matéria. Esse foi o verdadeiro reallity da vida real. Confinados nas entranhas da terra, as vítimas não faziam ideia do que rolava na superfície: até criança nasceu. Uma mulher deu à luz no pulsante acampamento Esperança. O papai estava lá embaixo, esperando por SOS.
Quando o resgate efetivamente começou, um deles saiu do buraco para entrar numa gelada. Foi recepcionado pela amante. A genuína ficou sabendo e deu o ultimato: "ou ela, ou eu". Que papelão, de vítima, virou safado nas telinhas do planeta. Mas em se tratando de homem, a infidelidade não surpreende, mesmo para quem passa a vida cavando debaixo da terra.
De certa forma, todos somos mineiros: estamos ai, querendo extrair da vida o melhor dela e num belo dia de sol, somos condenados a escuridão. Comemos poeira para sobreviver, damos duro para conseguir qualidade no estudo e um trabalho que nos torne gente. Fazemos o PIB do país aumentar, mas estamos relegados a uma condição social que não orgulha nem nossa mãe. Os "herois" chilenos, enfrentaram um apagão temporário e por milagre da tecnologia conseguiram sair ilesos, talvez com algumas escoriações psiquícas, mas nada que o tempo não trate de apaziguar. No buraco da vida real, não tem imprensa para recepcionar a gente e nem para fazer convites milionários de entrevistas. Os finais não são tão felizes como esse que assistimos. E eu digo com experiência de repórter que nunca foi para o Atacama: os jornalistas são a encarnação dos mineiros. Estão sempre cavando pautas e com o salário que ganham, vivem no buraco. Ou soterrados em trabalho, sem esperança de serem resgatados. Ossos do ofício.

PS: O número 33 foi tantas vezes exposto no incidente do Chile: 33 foram os homens e 33 o número de dias para completar o processo de perfuração do túnel. Existe uma mística envolvendo o algarismo. Desde a antiguidade o numero 33 vem sendo explorado pelas sociedades secretas.Na maçonaria, este é o mais alto grau. Quem o atinge é chamado de "Soberano Grande Inspetor Geral". Seria o maçom guardião.
No ocultismo, o 33 é considerado um número-mestre e representa a mais alta consciência espiritual a que um homem pode atingir.

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