terça-feira, 7 de maio de 2013

Frases de divã



Se vc n queria ser feliz comigo. Saberá ser infeliz sozinho?

A testosterona em alta cega qualquer visão de celulite

Tudo o que eu preciso é conviver bem com meu desalinho

Se  tive problema um dia, não foi por falta de felicidade. Não foi mesmo. Mas estou apimentando minha vida 50 graus a sombra

Fim nunca é bom. Se fosse bom, seria começo

A gente se ama, só nao se quer mais. Muitos me adoram, ninguém me ama.


Ela é mais básica do que azulejo branco.

Eu odeio intuição feminina. A minha nunca me deu uma boa notícia. Mas hj estou tao feliz que nem as pragas do Egito vão me atormentar.

A paixão fugaz é uma péssima administradora de recursos.

Casamento por amor é a mais desastrosa invenção do século, é a herança mais nefasta da revolução industrial.

Se a minha inveja fosse um dobermann, você estaria aos pedaços.

Quando a galinha sai para jantar com o lobo é porque esta a fim de virar canja.

Antes a infidelidade necessária do que a miséria garantida

Leva teu ego para passear na Sibéria.

"Os romnânticos são sempre derrotados pelos predadores."

sábado, 5 de janeiro de 2013

Eu amo essa linha do Rubiyaat de Omar K., mas que é a citação correta?

"A mão em movimento escreve, e tendo escrito segue em frente. Nem todas as suas lágrimas, nem todos a sua sagacidade, deve atraí-lo de volta para apagar meia linha, nem mudar uma palavra." 


quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

O Livro da Vida da Marianna

O Livro da Vida é uma obra que torna os alunos da sétima série escritores. Hoje, a Marianna recebeu a sua obra que marca a sua vida daqui para diante. Creio que virou uma literata sem exagero e eu fiz parte desta história. me orgulhei e chorei. Essa parte do blog será dedicada a sua obra porque vale a pena a memória. É profunda, e imersa em sentimento que pulsa dentro de uma adolescente que tem a vida inteira pela adolescente.  Eis seu preâmbulo. O que tem e o que virá.

Com o Livro da Vida

“A gente constrói a nossa vida, sem degraus, mas no meio do caminho, alguém que não sabemos quem, os coloca lá. Na maioria das vezes os degraus são pessoas, já outras vezes somos nós mesmos. Nós e a nossas palavras, atos, gestos e você sem o nós. O desafio não é viver, é saber como viver. Muitos de nós desistem no meio do caminho, outros pretendem continuar mas alguém sabe que não conseguirão. Quem ainda resta, fica vivendo com a pretensão de algum dia se livrar deste fardo.” 
- Marianna Rabaiolli in apresentação sobre seu Livro da Vida (ela o recebeu hoje - encerrando ciclo da 7ª Série. Chorei)


VIDA A PRESTAÇÃO


Marianna aos 9 anos


Agradeço a alguém, cujo o nome não sei;
Alguém que cuida de mim;
Alguém que não deixa vestígios;
Apenas prestígios;
Alguém misterioso;
Porém muito zeloso;
Alguém que me rege e me guarda e me protege.                                      






Um homem é feito de detalhes,
o resto é exagero.



Aos 4 anos
Os olhos curiosos da menina pequena e meiga já anunciavam: Marianna cresceria uma adolescente curiosa. E assim se fez. O verbo se verbalizou. A menina ganhou amor pelo dicionário e a mãe, orgulho por - num tempo em que a sociedade da informação busca tudo em rede -- ver que a garota teve apego às palavras.  Com o Livro da Vida, Marianna foi investigar vocábulos, desvendou ritos e mundos. Curiosa, impulsiva, apegada a Cazuza, cantando os dias de par em par, irritada e irritante, como toda adolescente que às vezes, mães julgam aborrecentes, Marianna cumpre seu rito de passagem fechando a sétima série falando da vida, e pensando na morte. É um exercício essencial para o amadurecimento de um jovem. O livro a levou a refletir sobre o que ela já foi e o que ainda virá. Ao longo do ano, ela viveu dias felizes, alegres e tristes. Gangorras de sentimentos. Como tem de ser uma garota que pulsa e vibra carregada de emoção. Como tem de ser a vida nessa fase da juventude. Assim, devagarinho, para preencher as páginas de um livro que virá a ser escrito nas páginas da existência. Em que ela é a protagonista principal. O fim, ela ainda irá escrever. Mas estas páginas estão em branco. E dependem de sua atuação aqui e agora. É certo que o Livro da Vida é um ótimo roteiro escolar. Pode-se adequar ou readequar o script, dependendo do esforço pessoal. É o que os alquimistas chamam de Lenda Pessoal.  O destino só vai até metade do caminho, o resto é Marianna quem fará.  A escola acendeu o brilho no olho. E fez voar. Resta aos alunos criar asas. Agora é com cada um deles. Mariannas, Marias, Eduardos. E todos os pais juntos.  Porque a vida é uma só. Um dia o publicitário Nizam Guanaes disse. Existem dois tipos de pessoas: aquelas que choram e aquelas que vendem lenços. Eu sou daquelas que vendem lenços. No Script de Marianna, não está que ela precisa vender lenços, mas se ela puder secar as lágrimas de alguém, está de bom tamanho.”
- Andréia Rabaiolli






O avô lê a poesia a seguir do livro da vida


RECORTES DE MIM

Eu sou uma artista louca
Saio de casa com o desejo
Poucas moedas e logo prevejo
A ansiedade pular pra fora
Querendo tudo aqui e agora
Como um violão ou algum cordão
Dedilho a vida sempre interrompida
Por algum mal
Disfarçado com um rosto angelical
Sou uma suicida do avesso
Termino tudo pelo começo.
A felicidade é um mal desejado.
Procuro sempre mantê-la ao meu lado.



Não é a vida mesmo, o viver real
vem depois da morte.


Muito mais do que um trabalho para a escola

A sétima série é o ano do conhecido Livro da Vida. Começamos esse trabalho observando representações de grupos de pessoas em telas de Tarsila do Amaral, Portinari, Lasar Segall e Di Cavalcanti; e também os autorretratos de Da Vinci, Escher e Monet.  Os rostos, os sentimentos e as vivências particulares se misturam para formar a história de um grupo, de um tempo. A individualidade é substituída pelo grupo. As características particulares perdem espaço para formas coletivas. A força desse movimento levanta algumas perguntas essenciais à formação do humano: qual o lugar para o meu eu nesse modelo? Ele comporta quantos eus diferentes? A única possibilidade é seguir a multidão ou dá para inventar outro caminho?
Uma das respostas veio na voz de Severino, de João Cabral de Melo Neto, no poema Morte e vida Severina. O retirante nordestino se apresenta na procura de sua individualidade. Fazer uma autobiografia é aventurar-se na busca dessa identidade.
A autobiografia pede que o autor se distancie de si mesmo para que possa reconstruir-se em sua unidade e em sua identidade. Esse movimento exige muita coragem porque o nosso presente é resultado de momentos que misturam diferentes sentimentos: alegria, medo, felicidade, tristeza, surpresa, saudade, amor, perda, superação, ...
Muito mais do que um trabalho para a escola, esse é um texto para você mesmo, para a sua vida, para a sua história pessoal. Nesse sentido, aquele que escreve a autobiografia busca a si mesmo através da sua história na tentativa de recuperar o tempo que se perde à medida que se vive. A recordação implica em uma relação complexa entre o tempo presente e o passado e o autor tem consciência desses dois tempos. A verdade que conta é a verdade do homem e não a verdade das ações. A fidelidade é a do homem consigo mesmo. Portanto, a autobiografia está muito além da verdade e da falsidade. A função artística sobrepõe-se ao caráter histórico ou objetivo. Aquele que conta a sua vida sabe que ela difere de todo o passado e que nenhuma vida futura se igualará a que ele viveu. Trata-se de um testemunho da vida particular, mas também de um depoimento que enriquece o patrimônio de uma comunidade, porque a história individual se relaciona com a história coletiva. O encontro consigo mesmo nos faz reconhecer o outro. A autobiografia traz a voz da memória sobre o vivido, ou seja, ficcionaliza a própria vida.”   - Adriane Hauschild
           
  

 POR ENQUANTO



Nem todo romance dura uma eternidade,
mas amor é pra sempre.


  Sabe aquela historia da princesa e do príncipe? Ela a outra metade dele e vice-versa, declarações apaixonadas, beijos quentes e calmos, como se fosse o primeiro, onde na desinência tem o clichê “Felizes para sempre”?
   Então... Esta não é a história.
   Ela, loira do cabelo até o ombro, olhos azuis um tanto fracos, um corpo nem muito e nem pouco. Ele não se sabe-la as feições, talvez um moreno ou loiro, sabe-se pouco, lembra-se pouco, mas leva-se muito .
   Ela no interior do Rio Grande do Sul, no ano de santo cristo não me lembro. Ele no Rio de Janeiro tentando “sacanear” mais um bocó por ai .
  Não estou dizendo que ele era um golpista nem sinônimos deste, longe disto. Muito pelo contrario, pelo que se ouviu, era esperto, ágil, pensativo e um bolso furado. Nome sujo na praça, comia do bom e do melhor, vivia nos melhores hotéis e apartamentos, vistas de frente pro mar, boa lábia, sabia passar até  um leopardo para trás, tanto em perna quanto em cabeça.
  Ela na faculdade de jornalismo cansada de escutar o “blábláblá” do professor entrou em um tal de chat da UOL( sim existia naquele tempo). Não demorou e um cara bom de lábia foi a elogiando, a conhecendo, indo com calma mas rápido ao mesmo tempo, ingênua a pobre coitada nem notou que estava caído em mais uma armadilha do destino (vulgo amor , os dois são a mesma coisa , sempre ferram com a gente).
   Todas as noites ela e ele conversam via internet. Um tempo se passou e uma proposta tentadora foi sugerida. Ele viria passar alguns dias no interior do Rio Grande do Sul, se desse certo ela iria para o Rio de Janeiro junto a ele . Topou, como eu disse, era ingênua.  
  Alguns dias depois lá estava ele, com as malas na Rodoviária de Lajeado, como boa moça Andreia foi busca-lo, não, ele não era dos mais bonitos, mas era gentil, carinhoso, educado... A sensualidade não importou naquele instante.
  Os pais dela (meus avós) gostaram do Mauro, parecia ser bem sucedido, e além do mais morava no Rio de Janeiro. Tudo até em então estava do bom e do melhor, aos pais lhe cabiam a ideia da filha deles passar a residir no RJ, ficaram com certo medo mas cederam, lhes pareciam um futuro certo...
  Depois de uns três ou quatro dias, Andreia e Mauro partiram para o Rio de Janeiro. A cidade maravilhosa era um mundo novo para alguém que vinha do interior do RS, cada lugar novo para explorar, praias belas para conhecer e um transito infernal para enfrentar .
  Ele morava no Leblon em frente ao mar, o apartamento era vago de espaço, mas a vista era linda. Todo santo dia de manhã minha mãe caminhava no calçadão do Rio, avistou famosos correndo na praia, e se encantava cada vez mais com a cidade.
  Mas ela também teria que ajudar nas contas da casa. O aluguel estava atrasado, era caro pois o apartamento onde moravam era um dos melhores do Leblon.
  Uma empresa de anúncios virtuais seria montada, estava tudo certo, a chances de dar certo eram as mesmas de dar errado.
  O tempo passou e o negocio tinha andando e as crises de casal chegado. Eles brigavam por tudo mas o principal assunto era o dinheiro, e com a noticia de que eu viria ao mundo alguns dias de pois as coisas apenas pioraram, mas meu suposto pai acima de tudo acompanhava minha mãe ao pré-natal e essas coisas que gravidas tem de fazer.
  Acho que ele seria um bom pai, queria poder conhece-lo, talvez um futuro longe ou próximo pouco se sabe sobre o amanhã.
  A noticia da gravidez surpresa de minha mãe  não amenizou as coisas, as brigas foram ficando mais frequentes e insuportáveis. Não tinha outra saída, a não ser minha mãe voltar para casa e me ter na pequena cidade do interior do Rio Grande do Sul.
  Como não havia outra saída, foi isto que ela fez. Voltou para Lajeado em um dia que meu pai não estava em casa, pegou apenas algumas coisas e se mandou dali.
   Estava novamente em casa com os seus pais, e preocupada com a chegada da mais nova habitante deste mundo redondo mas quadrado ao meu ver.  Depois de três meses as roupas deixadas no Rio de janeiro voltaram para o lugar de nunca deveriam ter saído , as gavetas do armário do quarto da casa dos Rabaiolli, do bairro Americano da cidade de Lajeado do estado do Rio Grande do Sul . Não se sabe a causa dele ter mandando as roupas de minha mãe apenas três meses depois de sua volta para casa, talvez raiva, talvez esperança, ou quem sabe não tinha dinheiro para mandar nem via sedex os trapos de minha mãe .
“[...] Mesmo com tantos motivos pra deixar tudo como está, nem desistir nem tentar agora, tanto faz, estamos indo de volta pra casa [...]“ - Por Enquanto; Renato Russo .






AQUI JAZ / INFÂNCIA



As lembranças inúteis permanecem de forma clara,
já as melhores são apagadas aos poucos,
para gente não lembrar de chorar
.
            A memória já lapidada não lhe ajudava muito, a caneta estava roída mais uma vez pela falta de auto controle da garota, os olhos atentos a cada movimento do como escolar, o som das teclas dos notebooks de seus colegas, os gritos das crianças que lhe irritavam entre inúmeros outros gestos, sons e etc. Pareciam mais atraente do que estar presa em uma sala de aula tentado priorizar alguma lembrança nostálgica do passado.
            Voltou com os olhos cerrados para o caderno, que mais uma vez era monopolizado pelas linhas cor de rosa em branco. Tremeu de frio e mordeu os lábios, juntou os pés os roçando-os ainda que calçasse um all star preto. Mordeu a traseira da caneta e jogou a cabeça para trás, os pensamentos foram instintivos “Desisto!”.
            Voltou-se para frente firmando a caneta corroída em suas mãos. Cruzou os braços sobre a mesa e infiltrou a cabeça entre eles, fechou os olhos e por um instante engoliu a saliva a seco, pensou algumas bobagens, semi-fechou os olhos e hesitou antes de dormir.
-Vamos lá Mari? – a voz da professora ecoou como um tormento. Levantou a cabeça sem vontade, as palavras lhe fluíram com tamanha facilidade:
-Não consigo escrever em sala de aula, sem concentração! – inventou alguma desculpa para continuar na monotonia do ócio. Abaixou mais uma vez a cabeça e pensou em dormir, mas em vão, sem sono, sem memória.
...
            Ao chegar em casa, correu ao computador e entrou no Facebook, a nova moda dos tempos em que profetizaram o fim do mundo, rolou página abaixo e voltou para o início, uma nova conversação havia sido aberta, era o que esperara, o que não conseguira fazer pela manhã.
Renata Breier Porto:
Como que ainda não me adicionou??? Como???? Pode corrigir isso... hehehe...linda, aí vai um textinho que fiz às pressas sobre tua infância, tá???
Qualquer coisa, posso melhorar... Nem revisei, já são 1h52!!!
Beijos enormes!! Te amo...
Tua doce infância
‘Quando Andréia descobriu que estava grávida tomou um susto, pois até ali, nunca havia se imaginado mãe, nem feito planos para isso. Mas respirou fundo e encarou o desafio, contando com a ajuda das amigas mais próximas e da família, que sempre a apoiou. Logo convidou para Dinda da Marianna, amiga Renata Porto. Foi ela quem deu a primeira roupinha, quando a barriga nem havia aparecido muito ainda. Era um macacãozinho que a Andréia segurou de cabeça para baixo e perguntou como se usava, mostrando sua inexperiência com o assunto.
Quando a barriga despontou um pouco mais, outras amigas organizaram um chá de fralda para completar o enxoval e apresentar a mãe ao mundo das crianças.
A gravidez não foi fácil, pois Pita engordou 31kg e ficou bastante inchada, retendo líquidos. O cachorro da Dinda, o Dengo, e o gato que tua vó tinha, adoravam deitar no barrigão da Pita. Talvez, por isso, tu goste tanto de bichinhos hoje.
No dia do nascimento foi aquele corre-corre. Nem todo mundo pôde ser avisado, pois as dores vieram tarde da noite. Marianna nasceu em uma madrugada fria de quatro de junho de 1999 e tinha bastante cabelo. Era uma penugem arrepiada e lisa e os olhos azuis já eram grandes e curiosos. O rosto não era como o de outros bebês, com “cara de joelho”, ao contrário: já era a mesma “carinha de Marianna” de hoje. Logo nas primeiras horas de vida, a enfermeira veio trazer o “pacotinho” todo enrolado em um felpudo cobertor para a mãe, sempre ansiosa. Acontece que a Nanna começou a chorar e, sem saber o que fazer, Andréia pediu socorro à enfermeira. Mas essa avisou que sozinha, deveria trocar a fralda, que deveria estar suja. Sem contar com ajuda e nenhuma prática, não conseguiu segurar as perninhas da filha que ficaram lambuzadas de cocô. Naquele frio todo, a menininha teve que tomar banho. No entanto, foi só dessa vez, pois com o susto, sua mãe ficou craque em trocar fraldas e em cuidar de ti. Parecia até que era o quinto filho.
Ao ir para casa, o primeiro banho foi dado com a preciosa ajuda da vó Míriam que sempre esteve presente na tua vida. Quando começou a andar, ficou tão feliz com a independência, que não queria mais saber de andar segurando na mãe de ninguém. Queria, inclusive, correr e olhava em volta procurando espaço. Geralmente caía ao tentar os primeiros passos e, para que não chorasse com o tombo, a gente se apressava em te dizer: “ôpa, caiu de madura! Não foi nada né?” E tu repetia a frase, concordando, mas na língua dos bebês.
Lembro da emoção que senti quando, pela primeira vez, disse para mim: “Di”, que significava Dinda...Quase morri.... foi lindo!
Você adorava que eu cantasse as cantigas infantis como “Ciranda Cirandinha”, “Se essa rua, se essa rua fosse minha...”, “Sambalelê tá doente, tá com a cabeça quebrada...”, “O cravo, brigou com a rosa, debaixo de uma sacada”, “Terezinha, de Jesus, foi à queda, foi ao chão, acudiram três cavaleiros, todos três chapéu na mão...”, entre tantas outras. Você adorava cantar “Marcha Soldado” e “Atirei o Pau no Gato” e queria que a gente ficasse brincando de roda até você cansar. Também curtia que contássemos histórias de livros, pois tu, desde muito pequena, gostava de folhear revistas e jornais – mesmo que estivessem de cabaça para baixo -, e fingia ler em voz alta.
Na casa da Dinda você tinha seu prato, seu copo e era a Rainha. Mas nesse época, a Dinda que ainda morava na mesma cidade, também servia como uma segunda mãe, já que te buscava na creche, te levava para passear e dava broncas quando fazia malcriação. Embora tenha sido uma criança tranquila e obediente, às vezes testava os limites dos adultos com quem convivia. Mas nunca foi manhosa, respondona, teimosa nem desobediente. Era muito carinhosa e meiga. Os cabelinhos começaram a encrespar logo e tu não gostava de penteá-los. A Dinda tu deixava te pentear porque ela segurava a ponta do cabelo para não machucar desde a raiz. Você sempre entendia as explicações que te dávamos quando precisávamos te dizer alguns nãos. Era tudo conversado. Como tua Dinda é pequena – baixinha – era ela quem entrava contigo literalmente nos brinquedos das pracinhas ou dos parques de diversões enquanto sua mãe ficava de fora fotografando ou babando.
No Natal e Páscoa adorava receber presentes e um dia, consegui que o Papai Noel contratado pela Prefeitura, que ficava na praça, te entregasse o presente que eu queria te dar. Era uma barraquinha iglu. Tu ficou tão contente e espantada com a figura “real” do Papai Noel ali na tua frente, que foi lindo ver tua emoção. Da mesma forma aconteceu quando a gente te levou, aos quatro ou cinco anos, pela primeira vez ao mar. Tenho a foto da tua boquinha aberta ainda dentro do carro, no momento exato em que teus olhos bateram nas ondas do mar de Santa Terezinha. Depois, foi cabreira até a areia e, finalmente, se rendeu à agua salgada, que depois, virou sinônimo de festa pra ti.
Tu sempre teve muitos amiguinhos na creche e nas escolinhas que frequentou. Te amo muito mesmo aqui de longe....’
Se eu lembrar de mais coisas, te mando, tá? Escrevi em texto mesmo pois não sei fazer de outro jeito. Vai tirando o que tu precisa. Milhões de beijos e abraços bem apertados. Te amo demais, minha lindinha... tô esperando as informações dos Rebeldes, heim?
Da Dinda Rê

Dinda Renata

            Mesmo com os olhos marejados, tratou de reparar o erro de não adicionar a sua dinda no Facebook, corou e riu com os olhos fechados, deixando alguma lágrima imprestável viajar dos olhos até sua boca. Lamentava em pensamentos por não recordar de um detalhe se quer, nada, a memória estava tão focada no presente e no futuro que o passado não fazia mais  sequer importância, será mesmo?
            Fechou a janela do Facebook, caminhou vagamente até o quarto, buscou nas gavetas e achou no armário, na última estante, subiu em cima da cama e esticou o dedão do pé até o dedo mindinho da mão. Pegou uma caixa da cor amarela semelhante a um marrom claro, posicionou-se na cama junto ao caixote em mal estado, revirou-o e admirou alguma fotos antigas, de sua mãe, sua avó, seu avô e... Suas.
            Os olhos azuis feito água ou até mais limpos que a mesma, bochechas fofas, feitas para serem apertadas, feição sapeca em toda e qualquer foto, lábios pequenos e vermelhos, mas vermelhos mesmo, sempre molhados, cachinhos castanhos bem encaracolados, sempre em perfeito estado e em abundância. Hoje ela é a mesma, pequena e ingênua, só que um pouco maior, sem muitos cachos e um tanto mais ágil.
            Deitou na cama junto a uma foto escolhida aleatoriamente, abriu espontaneamente um sorriso ao ver uma provável gargalhada congelada em uma foto, era uma boca vermelha úmida aberta com a felicidade dentro e fora dela.


  

FAZ PARTE DO MEU SHOW
  

Vou rezar mais um pouquinho,
para o tempo passar de mansinho.
Para vontade de viver ficar,
E a gente jamais esquecer de amar.

Nem mesmo o tempo é capaz de esquecer, quem dirá um ser humano?! As unhas que eram roídas na infância e adolescência haviam crescido ao longo do tempo, tratamentos, remédios, idas e vindas de terapeutas ajudaram a controlar a ansiedade mórbida que corroía as canetas que continha no estojo escolar. Ainda assim, deitada com a cabeça sobre o peito despido do homem de olhos azuis, lábios carnudos, cabelos pretos e sedosos dedilhava uma caminhada apressada pelo o cós da curta bermuda de tecido vermelho. Os olhos, que ao longo do tempo definiram a cor azul para os momentos de alegria e o verde de uma tonalidade forte e azulada tênue para os dias de chuva dentro de si, analisavam atentamente o berço lilás com estacas brancas que deixavam frestas para avistar o bebê que ali se encontrava com os olhos vendados pelo sono e o sono vendado pelos sonhos.

            Os lábios, involuntariamente foram puxados para cima, as covinhas continuavam ali. Ah essas covinhas... Ah esse sorriso... Não que houvera conquistados muitos garotos durante seus 15 á idade indefinida, mas ficará aos beijos diante das vistas mais lindas com os mais sensíveis canalhas. No entanto, o maior deles continuava ali, ao seu lado, de olhos fechados e com uma sonoridade de ronco saindo de suas narinas.
            A tempestade começou. E não veio dela. A pequenina da pequena remexia-se no berço chorando em um tom agudo. Levantou-se rapidamente, sem deixar com que o marido notasse e acudiu o mais rápido a morena cabeluda. Tomou-a em braços e cantarolou alguma música sem emitir nenhum vocábulo, apenas os tons em uma espécie de “hum...”.
- Shii. – balançou-a em braços. – A mamãe está aqui. – o choro diminuiu, mas continuou em sua tonalidade aguda. – Estou aqui meu bem. – as mãos minúsculas remexiam-se procurando por algo a sua frente. Marianna abaixou o rosto deixando que os dedos de Melanie tocassem em suas feições alisando-as com carinho. – Eu vou estar aqui, para sempre. Eu prometo. – sorriu ao ter o nariz agarrado por sutis mãos.
            Em poucos segundos o local calou-se. Nenhum som era emitido, apenas o silêncio dos pensamentos da mulher já adulta que cursará medicina, mas seguiu para a carreira de atriz. Foi um simples acaso. Sem descaso, e ainda jovem ela seguia pelas ruas de Porto Alegre, tentando chegar até a PUCRS para decidir se iria fazer a residência médica, ou não. Foi uma simples visão de um olheiro que passava por ali, olhando-a conversar com uma mulher desconhecida pedindo por informações. Seguiu a garota até a universidade, olhou-a de longe “Se não atuar, lhe dou umas aulas... Além do mais é perfeita para o papel!” pensou rapidamente. Antes que ela pudesse escolher a psiquiatria para se especializar, o homem de terno preto e careca puxou um assunto interessante, levou-a para um café ali perto. Feito. Nem precisou das aulas grátis, na infância havia interpretado diversos papeis na escola e na casa de cultura de sua ex-pequena cidade. Dois anos após ter saído em turnê com o papel principal, pelos cantos do Brasil, um autor de peças consagradas admirou-a durante a peça. Lá estava Marianna, sobre o palco encenando alguma nova peça que era um sucesso no ano de 2023. Foi admitida por uma emissora um ano depois, e com 26 anos estava na novela de horário nobre. Fez filmes, teatros, novelas, series, escreveu roteiros até chegar aos livros infantis, ir aos romances infanto-juvenis e subir para a literatura adulta. Era uma vida agitada, mas tranquila. Não reclamava um dia sequer, nem depois do casamento, muito menos após o nascimento da filha.
            Seguiu até a pequena biblioteca que tinha em sua casa, acomodou-se na cadeira de balanço, jogou a cabeça para trás e fechou os olhos. Sonhando com a realidade de um pretérito.
            Os cabelos longos, levemente ondulados, olhos azuis semelhantes a verdes, os dentes alinhados em carreiras formando um sorriso espontâneo, a boca singela, as covinhas implantadas no rosto. Momentos atordoantes, ilustres, inéditos, pertencentes a uma só pessoa. Cantigas em tons amenos ou extrapolados, desenhos dos mais bobos, ilustres e extrovertidos.
Ela era pequena, por volta de uns 5 ou 6 anos, habitava a creche e era rodeada de amigos, desde os mais irritantes até os alegres e contagiantes. Não lhe era vago, era continuo... Uma blusa rosa anêmico tinha o centro de uma boneca sapeca, os cabelos coloridos, verdes, vermelhos, era toda remendada, feita de pano. Sua blusa preferida, já estava bem surrada, era uma peça popular. As garotas escolhiam aos outros a dedo, “Com quem devo me juntar? A que bem me entender” pensavam pequenas crianças bobocas. A blusa que obtinha a boneca Emilia centralizada no meio de um rosa frouxo, foi o que fez a pequena tola juntar-se a outros pequenos tolos.
Cursava o jardim de infância. As coisas que lhe ensinam quando é criança são as que realmente importam. Os mandamentos de quando erámos pequenos, estes nos ajudaram a viver, aprender a como ser, ensinaram o que fazer a hora certa de tudo acontecer... A verdadeira inteligência está no jardim de infância, não nos cursos de pós-graduação, colegial, faculdade, mestrado... Está na caixa de areia, no velho escorregador, nos balanços enferrujados, nos desenhos que somente o artista sabe o que é. A gente aprende e entende. Entende que é preciso compartilhar para também poder usufruir da diversão alheia, aceita que é necessário jogar dentro das regras, para não cair, sem querer, no meio da trilha que você percorre no tabuleiro, na cadeia. Aprende que tem que se pedir desculpas após um ato insano, mas pedir perdão verdadeiramente, mesmo! Percebe que para ser saudável tem que ser sustentável e ter um equilíbrio entre desenhar, pintar, dançar, pular, pensar, dormir... Compreende que se tem muita coisa maravilhosa entre o espaço que se tem até a morte. E a gente aprende que seja qual for o animal, cachorro, peixinho dourado, coelho, tartaruga, todos morrem... Até nós.“
Ao longo do tempo o jardim de infância morrera, os números de telefone de suas amigas, endereços, etc. Também se foram, não porque quiseram, mas sim, porque todos partem, até a saudade e a dor. Há um tempo a trás “era uma vez” e “felizes para sempre” não eram costumeiros, hoje em dia lê-se em qualquer história de conto de fadas.
“Algo inusitado, espontâneo mas pavoroso, era o medo, ele tinha lhe tomado, do ultimo fio de cabelo até o maior horrendo dedão do pé. Um local diferente, matar ou morrer, o território que passaria a frequentar não era mais o mesmo que o da escola primaria, agora haviam também os gigantes, nada mais de “só crianças” era um outro mundo, cada um por si e Deus por todos. A mãe loira dos olhos azuis, carregava consigo algumas caixas com os matérias que a escola havia solicitado. A pequena e a adulta caminhavam com certa dor no peito, a baixinha tinha medo e a mãe da menina tinha receio de deixa-la sozinha. Mas de um jeito ou de outro isso aconteceria e seria doloroso do mesmo jeito. Os meses se passaram e a pequenina continuava no seu canto, sempre sentada no mesmo lugar no intervalo, com sua lancheira, sozinha, observando as pessoas se confraternizando e fofocando pelas costas umas das outras, de certa forma se sentia aliviada por não fazer parte daquele mundo rebanho. Tarde de mais, se uma garota de cabelos lisos e castanhos não tivesse a avistado, talvez ela fosse mais forte... As duas levaram um papo um tanto constrangedor, mas passaram a se entender rapidamente. Cerca de uma semana depois, outra garota se juntou a elas, a dupla tinha se desfeito, a partir de agora seria um trio, não por muito tempo...
            A primeira serie havia sido abaladora, sua mãe havia sido atropelado e isso mexeu em suas estruturas de uma forma... Sua professora favorita, que lhe mimava, iria se mudar para São Paulo e outra mulher de cabelos negros a substituiria. Sentia raiva, ódio, por mais que a estagiaria tentasse se aproximar ela se esquivava, de modo algum queria contatos, não com quem havia tomado o lugar de outra pessoa e queria dominar o novo habitat. Não, não dessa vez. Não lembra-se o porquê da briga, apenas da chuva em seus olhos, recordava-se dos olhares atentos para ela e a professora, ela tinha medo do mundo e de suas deixas, aos sete anos ela perderá alguém de quem gostava muito, isso era só o começo... A pequena se escondeu atrás de um armário e com as mãos tentou abafar o choro, era constrangedor desabar na frente dos outros, mas era necessário, cedo ou tarde isso viria a tona de qualquer maneira. Outra mulher um pouco mais simpática, conversou com a menina a acolhendo.”

- Ah você está ai. – a porta esculpida com detalhes na madeira foi aberta.
- Hã? Ah Arthur. – ela suspirou atordoada.
- O que foi? – seguiu em passos rasos até a morena dos cabelos ondulados e ajoelhou-se fixando seus olhos nós dela. – Você parece angustiada. Nunca lhe vi assim, achei que a alegria escorria até por suas lágrimas. – alisou seu joelho descoberto.
- Não é nada querido. Não se preocupe, continuo alegre mesmo com saudade. – afagou as bochechas lisas de um rosto com o queixo quadrado.
- Saudade? É algum ex-namorado, ou algo do tipo? – ele sacodiu a cabeça tentando se desfazer de pensamentos ciumentos ou possesivos demais.
- Ah meu amor, você deveria substituir Rafinha Bastos. – gargalhou fechando e abrindo os olhos diversas vezes.
- Me chamando de piadista irônico? – com o cenho franzido, os lábios entortados e os olhos azuis arregalados, mais uma vez, adentrou nos olhos de sua mulher. 
- Não tire palavras da minha boca. – ela o alertou entre um sorriso amarelo e um balançar da cadeira singelo.
- Vou fazer você cala-la. – esticou-se para alcançar seu rosto, roçou o nariz pelo pescoço chegando até o canto de sua boca, colou seus lábios nos dela, selando assim o silêncio do cômodo.

            É que ela já tinha amigos, mas não paixões. Na verdade os seres crescem, e o coração cresce junto conseguindo amar mais de uma pessoa. Intrigante seria se os pulmões se apaixonassem, mas não são os órgãos que se apaixonam, são os humanos.
            “Tinha sabe-se lá quantos anos, 10 ou 11, o menino não era o tipo ‘boa pinta’, suas feições e seu corpo não eram do tipo que provocassem uma reação sobrenatural nas garotas de sua idade, nada além do normal, apenas sua estatura, lhe confundiam com as crianças da 1ª e 2ª serie. Ora isso era uma ofensa para quem estivesse num ano tão avançado como a 4ª serie. Um gringo, baixinho que falava atravessado. Pior que isso, só se apaixonar pelo melhor amigo. Enrascada dupla. Tripla. Ele era pegador. Oh céus, onde ela havia metido o juízo? Deixará dentro do útero de sua mãe. Ah se pudesse voltar para aquele lugar apertado e quentinho de onde viera. Não que doesse ver ele ficando com outras garotas na sua frente, mas lhe subia a raiva, um sentimento possessivo, que os homens nomearam ciúmes. Deus, o que ela fará? Nem tomar conta do próprio coração sabe, como tomará conta da vida?”

            Quando as pálpebras se tornam pesadas é difícil levanta-las, isso acontecia toda amanhã. Acordava com um bocejo longo, os pés remexendo-se sobre os do marido e as mãos deslizando encima do peito do mesmo. O despertador da casa era o choro da filha de 7 meses. Toda manhã, exatamente as 7:40 a criança chorava de fome, depois dos 6 meses de amamentação quem passou a atende-la de manhã foi o pai.
-Hoje eu vou. – ela o impediu de se levantar com as mãos em seu peito.
- Tudo bem. – ele sorriu recostando-se na parede. Admirou por minutos incontáveis e maravilhosos a mulher do cabelo moreno, longo e ondulado com sua filha em braços. – Ela tem o seu nariz. – apontou para o rosto do bebê já satisfeito.
- Tem seus lábios. – retribuiu ajeitando-se na cama com cuidado. Ele tomou a pequena de seus braços com cautela e sorriu ver os olhos azuis e arregalados de Melanie observando-o.
- Seus olhos. – afagou com o dedo indicador as bochechas lisas e macias da menina.
- Melhor parar, sei que no fim isso da briga. – riu baixinho encostando a cabeça nos ombros largos de Arthur.

            É que talvez o fim ajude a começar. As pessoas começam do nada e entram em desespero quando tem que construir tudo de novo. Se em coração de mãe sempre cabe mais um, por que na vida, a gente não pode recomeçar sempre do um?
            “Pode ser difícil, mas não vai ser fácil você não tentar. O negócio é sair da zona de conforto, ousar. O ideal não significa idealismo e revolta não quer dizer revolução. Hospício também é lugar pra ser feliz, e louco mesmo é o racional, que não cuida do próprio nariz. É só o exemplo, não é a vida mesmo, o viver real vem depois da morte. Mas não se preocupe com a morte, preocupe-se com o que vem antes dela. Melhor mesmo vai ser se você não se preocupar nem com isso. É só o dito de um ditado que me disse que a vida é assim, pois se for assado, morro cremado.
            Era pra ser só mais um ano, mas como se não é na monotonia contínua? Outra monotonia, e essa pior, vem acompanhada da rotina. Não é a mesma coisa, nem o mesmo negócio, não viver mais ócio. Amar ocupa. Mudar também. É que tudo se transformou, ela mudou de escola, amigos, pensamentos, jeitos... Passou a ter ídolos, criou um amor sem explicação, lógica. Mas tudo acompanhado da dor. Ela aprendeu a sentir a dor da partida, aprendeu a criar esperanças e aprendeu que essas esperanças são destruídas num segundo por fatos pessimistas demais para serem realistas, mas soube reconstruir a fé. Não deixou que o choro da noite a afeta-se no dia, nenhum acontecimento do fim de semana deveria ser revelado durante os dias escolares. E mesmo sem saber o que fazer com a saudade, existe a vontade e desejo de vencer.”

 - Você está chorando? – ele desviou o olhar da criança voltando-se para Marianna.
- É só um cisco. – ela limpou as lágrimas que deslizavam da borda de seus olhos até a ponta de sua boca que delineava-se com a língua a cada minuto.
- Qual é o nome desse cisco? – ele perguntou ainda fitando os olhos dela, agora verdes.
- Nostalgia. Angustia. Não sei. – ela balançou a cabeça para tentar esquecer qualquer coisa que a fizesse chorar o passado.
- O que aconteceu para você estar assim? Há dias que não come direito, não se concentra no trabalho, quase nem fala. Oras, achava até ontem que era um milagre você trocar poucas palavras comigo durante o jantar. Mas depois de ver você pensativa na biblioteca e agora chorando... Nem sei mais. – voltou a encarar a filha que mexia as pernas e braços serelepe.
- Deve ser a TPM. – falou interrompendo os pensamentos de lições de moral ou cortadas que poderia dar no marido.
- Mas a TPM não é sua fase mais alegre? – voltou a fuzila-la com o cenho franzido.
- Pois é, mas acho que esse mês deu TPM na TPM. – lhe beijou entre um sorriso ligeiro.


            Não é porque durou um tempo que não foi de verdade, até amor tem prazo de validade.
            “Ela só tinha 13 anos, chorar por amor é, talvez, a pior dor existente, chorar por um amor que nem é seu, pior ainda. Como faz para desapegar? Há algum remédio? Oras se tivesse se tornado médica, quem sabe descobriria esse tão benéfico remédio contra apego, que todos procuram, ora ou outra. É difícil aceitar que alguém pode seguir enfrente sem sua metade. Mas a verdade é que não temos só uma metade, são varias e das mais variadas espécies, a gente acaba ficando com a mais próxima, no entanto, talvez, a mais apropriada deixamos passar. Sobe uma raiva, desde a unha mais horrenda de seu pé até o último fio de cabelo repicado, ao ver que ele deixou ir a mulher, quiçá, maravilha! Existem tão poucos namorados que abrem e fecham a porta da geladeira noites seguidas, são poucos que têm coragem de voar em um avião sem asa, pouquíssimos que mesmo correndo contra o tempo tem todo o tempo do mundo e raros casais tem os pés no chão mas as pernas pro ar.”

            Dos 32 anos ela pulou rapidamente para os 76, no auge de sua velhice continuava a escreve livros, montar peças, adaptar roteiros, etc. Na cadeira de balanço enferrujada da varanda, um manto branco cobria suas pernas, deixando seus tênis amostra, por mais velha que fosse continuava com manias de adolescente, usava all star em qualquer ocasião, a idade não a pegava, ela pegava a idade, ou ao menos esperava isso. Pulou tantos anos, tantas demasiadas fases de sua vida. Aah idade, você chega tão depressa. Podia esperar pelo menos pela próxima previsão do fim do mundo. Um grito semelhante a uma risada ecoou pela casa, provavelmente era sua neta brincando de pega-pega com o avô.
-Mamãe? – a voz de Melanie soou ao abrir da porta.
- Sim querida? – respondeu simpática a filha já adulta e formada em medicina.
- Eu e Caio decidimos nos divorciar. – despejou as palavras engasgadas.
- Sempre falei que a ideia de casamento não é uma boa. – a velha sorriu entre covinhas enrugadas.
- Vamos nos separar de vez. – Melanie tentou explicar. – Não sei mãe, mas... – engoliu o ar que inspirara em seco. – Não quero acabar como você e papai, parece que se vêm obrigados a serem felizes para sempre, como contos de fadas. Nem ao menos casados são, igreja, cartório, nada. Parece tão, tão...
- Desábito? – sorriu amarelo para filha e afagou o rosto doce da mulher já formada. – Sabe querida, nunca gostei de costumes, por isso não me acostumo com a rotina.
- Mãe... – a garota riu e abraçou a velhota que lhe abrigou nos braços já enfraquecidos.- Lembro que você me dizia que nada é para sempre, eu já tinha me conformado com essa ideia há anos, mas por que, agora no fim parece tão complicado? – afastava-se da mulher dos cabelos grisalhos.
- Porque o fim é tão duro quanto o começo. No entanto o começo é mais prazeroso que o fim, e no final a gente só lembra o quão saboroso é o meio. Tornando assim, fim sinônimo de saudade e vontade de voltar ao ontem que a gente não viveu. – secou com as mãos ásperas as lágrimas que desciam dos olhos azuis da menina que há tempos a trás trazia consigo no ventre.
- Ai Sophia, assim você quebra o vovô. – Arthur chegava a varando com a pequena nas costas.
- De novo vovô, de novo vovô. – pedia a criança dos cachos negros sobre as costas doloridas do velho.
- Assim você vai matar seu avô menina. – Melanie tirava a pequena das costas de seu pai e a colocava no chão. Logo as sapatilhas rosadas batucaram as tabuas de madeira do chão. – Tudo bem pai? – perguntava erguendo o homem não mais robusto.
- Tudo sim, meu bem. – ele respondia com os batimentos do coração acelerados.
- Vovó canta aquela música da despensa que você cantava pra minha mãe. – Sophia se aproximava da avó que logo a pegou no colo.  Melanie gargalhou e puxou uma cadeira para seu pai sentar, em seguida sentou-se na escada e esperou ouvir o tom tênue da voz de sua mãe.
- Meu amor essa é a última oração, pra salvar seu coração, coração não é tão simples quanto pensa, nele cabe o que não cabe na despensa, cabe o meu amor, cabem três vidas inteiras, cabe uma penteadeira, cabe nós dois, cabe essa oração... – cantarolava enquanto a neta batia palmas entre sorrisos sorrateiros.

            A gente não entende que pra se começar, alguma coisa tem que terminar. O “era uma vez” dos contos de fadas sempre indicam o início, mas na vida real geralmente anunciam o fim.  Não se vive numa cidade, ou num lugar, se vive uma vida. Se mora ou se habita o local. O ser humano não pensa, ele despensa argumentos inúteis. Para se buscar por alguém é preciso primeiro ter perdido. Mas não se perde o que não se tem. Então... Não tem sentido? É assim? O mais doloroso da morte não é você terminar de viver, é você descobrir que não há algo, nem alguém que saiba todas as respostas. Digo, a gente descobre as respostas no caminho, mas nunca sabemos qual é o caminho. A trilha mais fácil é aquela que a gente não segue. Sempre falavam que “A vida é cheia de perguntas, viver é descobrir as respostas.”, mas quando realmente se começa a viver? Se o homem é um cadáver adiado, adiamos a morte e nomeados esse adiamento de vida. É que a vida em si, é tão pavorosa quanto a morte, mas a morte é tão mais tranquila do que a vida. O seu cachorro, seu gato, seu peixinho dourado, ou seja lá qual for o animal de estimação, ele costuma morrer junto de gente, mas o homem em geral, morre sozinho. Não é tão difícil morrer, também não é tão espantoso. Não se iluda com céu, muito menos inferno, depois da morte, você não irá a lugar algum, já viu cadáver andar? É uma auto consolação, ninguém quer acreditar que a gente morre, e pronto, deu. Para o homem tudo precisa de explicação, de sentido, a gente morre e vai para algum lugar, essa é a crença. Preocupam-se demais com o que é certo que vai acontecer, as pessoas falam tanto da morte que parecem que a querem logo, ou tem medo que ela não venha. Mas ela vem. Vem assim, do nada. Num momento feliz, ou não. Chega, de mansinho, começa nos pés e vai até o último fio de cabelo. É no meio de uma canção, no meio de um texto, de uma declaração, numa cerimonia ou até mesmo entre um nascimento. A gente vai, assim, sem notar que a gente foi. É que a vida enjoa, enjoa de um jeito que deixa saudade...
Vò e Vô
A vida se vive toda a vida, mas sempre a prestação