Faz 20 anos que seu Oswaldo me conhece:2012 completa duas décadas da primeira vez em que eu o vi. Ele sempre me chamou de “guriazinha”. Até hoje diz assim, mesmo que eu esteja com 40 anos. Ainda quando eu era pirralha que saía de Garelli para fazer as páginas policiais do jornal, ele me falava: “tu toma sopa de garfo. Mas é bom que esse jornal tenha os loucos e os normais para ser equilibrado.” E assim eu fui assegurando meu lugar entre os insanos da redação
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Eu conheço o seu Oswaldo há três dias:pudera ainda não saber escrever seu sobrenome. É difícil de conhecê-lo porque ele tem tanta história e mesmo que seja transparente como uma tela branca, sempre tem mais coisas para saber. Seu Oswaldo é tela branca, não tabula rasa. Mas eis o motivo da crônica em plena semana do Dia da Mulher: é que seu Oswaldo é meu leitor. Como que isso não vai ser lisonjeiro, gente?Como?Quinta-feira, 9h da manhã. Sou chamada para ir na sala da direção. Repórter que vai na sala de Deus,sobe por três motivos: para cobrir as visitas que são numerosas; para reclamar de uma situação ou para levar uma carraspana. Eu só gosto de ir para fotografar as visitas. Quando não tem forasteiro no jornal e alguém me diz: “Pita, sobe no seu Oswaldo”, fico tensa. God, não fui eu.
Seu Oswaldo tem uma mesa longa do lado da sala principal. Ele se aboleta na cadeira e fala tanto quanto os visitantes. Tem sempre o costume de apresentar os repórteres aos convidados, mas nunca de um jeito formal: Este é fulano, da editorial de Geral. Jamais, fala assim. Seu Oswaldo foge do lugar-comum. Na quinta-feira, me apresentou assim: “esse é um bichinho que incomoda, mas eu a leio sempre, já de olho para saber o que vai falar de mim.” Em dado momento me diz: “Pita, um leitor tu tem e sou eu”. Eu me inflo de orgulho e para agradá-lo, mesmo sem ele saber, gostaria de escrever seu sobrenome certo. Mas não dá: invariavelmente olho no jornal o nomezinho holandês grifado. Aquele w junto com o “e” me deixa confusa e ele se irrita quando vê seu nome errado.
Duas coisas pecaminosas: escrever von Leeuwen equivocadamente e mascar chiclete. Deus é capaz de provocar um armagedon na redação. E ele acha que a gente não sabe que ele fica espiando pela janelinha da redação, observando se alguém está movimentando a boca sem falar. É praxe os veteranos advertirem aos jornalistas novatos: “está mascando chiclete, se o seu Oswaldo te pegar..” e a reprimenda paira no ar.
No ano passado, seu Oswaldo foi presentado com um iPhone. Morri de inveja. Subia e descia com a engenhoca pedindo para os guris viciados em tecnologia como se usava. Fuçou, fuçou e aprendeu. Com 83 anos, ele responde aos e-mails dos seus funcionários. Envia textos que acha interessante e dá uma lavada de modernidade nos octogenários comuns. Dia desses, explicou para um alfaiate mais novo que ele: “nós não damos cópias de fotos porque não fazemos mais revelação de filme. Só passamos por e-mail”. Eu vi que o senhor alfaiate não estava entendendo nada e me marcou sobremaneira o abismo entre os dois homens da mesma época. Um na era digital, outro na da máquina de escrever. E os dois de suma importância para a história do Vale: um fez a imprensa, outro se tornou personagem que saiu na imprensa.
Seu Oswaldo me surpreendeu porque na quinta-feira, pela primeira vez fiquei sabendo que o pai dele queria que ele fosse médico. Jamais quis trilhar a profissão do pai e partiu com 17 anos para fazer sua vida. Parece tudo tão distante para um homem que já fez kraf maga, uma arte marcial israelense com golpes rápidos e que foi ensinada aos militares. E como tudo é cíclico, o kraf maga do seu Oswaldo do século 19 retorna à cena, se popularizando apenas agora entre os brasileiros. Seu Oswaldo já sabia.
Afeito às ciências esotéricas, seu Oswaldo tem um pensamento poderoso. Ele sabe o poder da mente. E sai com cada frase engraçada. No Dia da Mulher, as funcionárias ganharam maquiagem. Era um entra e sai de mulherio na sala de reuniões que o chefe foi vistoriar. Ele disse: “não estou gostando nada disso”. O pessoal se preocupou: “Por que, seu Oswaldo”. Ele lasca: “como a turma meio-termo vai ficar?”A risada prevaleceu. Não cabe na frase preconceito. É senso de humor e de espírito. Eu penso que o seu Oswaldo é nosso Silvio Santos. Ele diz as coisas sem papas na língua e faz a política das portas abertas. Acolhe quem quer que seja na sua sala, vai tomar cafezinho no setor comercial e larga os jornais do dia na redação. Os repórteres sempre reclamam que ele recorta as notícias. Mas Deus, pode. Só não escrevam van Leeuwen com V maiúsculo. Ele periga dar um gole de krav maga em você. Só falta aderir ao Facebook. Ôôôôôô, seu Oswaldo vem aí!
Um comentário:
Tá querendo aumento? hehe
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