quarta-feira, 27 de julho de 2011

Divórcio a jato

A Vida miojo determina relações em que tudo é feito de forma instantânea, inclusive dar fim ao amor. Hoje é mais difícil apagar a marca da aliança do que dar fim ao casamento. A nova lei que agiliza o divórcio imediato completou um ano com as estatísticas em disparada. O número de dissoluções no Cartório Civil de Lajeado aumentou em 48% em um ano. So neste, houve 84 divórcios no cartório. Até o nome pegou: “divórcio a jato”. A legislação atual permite o fim do casamento em até 24 horas. Em Lajeado, o trâmite é feito em cinco dias, o que não é nada tardio, se for levado em conta que antes, o casal tinha que ter pelo menos um ano de separação judicial. Para um divórcio sem partilha de bens, o desembolso é de R$ 44,80.
Pilula do dia seguinte, Viagra, camisinha saborosa e um arsenal de acessórios da sex shopp promovem o amor erótico. Casar e descasar é como zapear na televisão. Se você não tiver um bom marketing pra segurar o camarada, danou-se. Perdeu playboy!Estás separada...mas ainda restam as fotos Dress the trash que você pagou caríssimo como ícone do amor eterno. As fotos, elas salvam o ritual. Quando não pagam o pato do divórcio....

quarta-feira, 20 de julho de 2011

A dor do diferente

Simone toca piano, flauta e guitarra. E nas horas vagas, treina o afinamento da sua voz em aulas de música. Simone se engaja no que faz e está preocupada com a justiça social. Simone recebe o mesmo valor salarial do que Eduarda. Ambas atuam no grupo Tenha Dó, Faça La e Guarde em Si. Um quinteto que peregrina pelo Estado causando impacto e sensações através da música. Eduarda é uma boa musicista, mas só toca trompete. Enquanto Simone atua em quatro frentes, robustecendo e qualificando o grupo, Eduarda se mantém na sua posição. Faz bem também, mas é mulher de um instrumento só. O maestro diz que não dá para aumentar o salário, porque a disparidade iria contra os princípios de igualdade, afinal as duas estão na mesma categoria. E depois deste patamar, a única categoria existente é a de regente. OU seja, apesar de Simone ser uma mulher-orquestra, estará relegada ao principio de igualdade do quinteto Tenha Dó.
Acontece que Simone sabe ser diferente. Essa diferença às vezes causa exclusão. Com tantos instrumentos ao redor de sí, o seu mundo, a sua percepção, são aptidões artísticas. Ela também tem mania de dizer tudo o que pensa, algo que desafina do coro dos contentes. Nunca é conveniente ser lúcida demais. A lucidez em excesso proporciona um estima de loucura, eis aí outra diferença. Mas Simone gosta desta cara limpa. É como se ela conseguisse o equilibrio cortejando a insanidade, como cantaria Renato Russo.
Mas em síntese, quando a banda toca, ela se sobressai. Digamos que em campo, ela seria o atacante. Pode-se difamar o diferente, mas a verdade é que o diferenciado é o melhor entre os iguais. Áristóteles percebeu isso há milênios e identificou alguns principios da igualdade, entre eles o da "igualdade proporcional qualitativa", significa tratar igual os iguais e desigual os desiguais. É um paradoxo complicado: tem que pensar um pouqinho, mas em síntese seria: desigualar para criar igualdade.
Dentro da nossa histórinha fictícia, a musicista Simone deveria receber um salário maior do que Eduarda para que a igualdade fosse realmente justa. Ela possui um mérito maior. Então é assim ó, nas palavras de Rui Barbosa: "Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não, igualdade real".
Ao tentar fazer justiça com uma norma equivalente a todos, a diretoria do grupo Tenha Dó pecou na injustiça porque igualou o salario de Simone ao da Eduarda. Os juristas dizem que na desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade”. Deste modo, “a desigualdade nem sempre é contrária à igualdade”.  Eu confesso que essa é uma relfexão egoísta. Eu poderia falar da lei de cotas, dos deficientes, mas escolhi o ângulo salarial numa historinha falsa para ponderar sobre o principio da isonomia.
Mas olha só, estou completamente errada pela ótica da CLT:  o princípio de isonomia salarial entre os empregados está baseado no salário igual para trabalhos de igual natureza, eficácia e duração, sem distinção de nacionalidade, sexo, raça, religião ou estado civil. Talento, esforço e dedicação não estão inclusos na regra da equidade. É a dor do diferente!

São todos iguais
E tão desiguais
uns mais iguais que os outros
(Engenheiros do Hawai)

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Amor Platônico

A fruta nunca cai longe do pé. Mas a fruta se aperfeiçoa. É a tal eugenia natural, creio eu. Em 15 minutos, a filhota da mamãe apresentou um poema bacana para a professora de português. Depois veio correndo me mostrar. Fiquei orgulhosa e disse a ela: - filha, tu leva jeito para jornalista. Marianna, de 12 anos, me retrucou: - Levo jeito para jornalista, não para ser pobre.  Me lembrei: jornalista pobre é pleonasmo. Mas aqui vai o poema da dona Marianna Rabaiolli, filha de escola pública.

Não sei onde estou
Não sei onde vou
Te encontro em alguns dias
Te vejo andar pelas vias
Não sei se te quero
Não sei le levo um lero
Quero você mas não falo
Se falasse, riria é claro
Amor ou paixão
O que sente o meu coração?
Paixão vai e passa
Amor marca
Não se esquece
Vou crescer e me casar
Será que esse amor vai parar?
Se ficasse com você
Iria só piorar
Por que você nunca
Iria me Calar

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Isabel mata Tina, a viciada

 Isabel Cristina da Silva (35)não tinha nome nem sobrenome há um par de anos. Tudo o que possuía era um apelido conhecido da polícia. Tina, a pária. Cinco filhos, 1,60 de altura e outros tantos metros de ficha corrida criminal. Por 34 vezes levada a Delegacia de Polícia, autora de furtos e arrombamentos e por três, encarcerada. Tina, uma alcunha maculada pelo crack. Tina, reformada, agora surge como Isabel. O primeiro nome será seu escudo, uma maneira inaugurar a mudança de vida que iniciou há um ano e quatro meses: 487 dias limpa: 701.280 minutos que não mais se esvaem na fumaça do cachimbo imundo. “Eu não aceito mais que me chamem de Tina. Sou a Isabel”.

Sua história de drogadição foi curta, intensa e devastadora. Uma viagem ao fundo do poço que começou aos 30 anos, quando ela já fora mãe de cinco.
. Enfeitiçada pela droga da ilusão, ela colocava em perigo sua segurança e a dos filhos. O pequeno, com 12 anos à época, a vigiava duas esquinas antes, embaixo de uma parada de ônibus, para que nada acontecesse à mãe enquanto ela fumava até o restolho da pedra.

Virou zumbi. Com demais zumbis da cidade, começou a furtar. Exterminava 20 pedras por dia: quinze minutos sem entorpecente eram eternos. “Depois que me atirei e que não vencia mais o vicio, cheguei a gastar R$ 3 mil em duas noites.” Crack e álcool, companheiros de solidão. Pela cidade, Tina vigiava as casas. Batia e aquelas em que ninguém respondia, arrombava. Televisão, micro-ondas, aparelhos eletrônicos surrupiados e repassados para receptadores. Recebia R$ 50 reais por um televisor 20 polegadas. Fumava o dinheiro em três horas.

“Tina, um perigo a sociedade. Rádio, jornal, promotor diziam isso. Eu me sentia um lixo, eu queria sair mas a droga não deixava. A droga tirou o sentimento, o amor que tinha pelos filhos. A droga tira tua dignidade.” Tina, um produto do crack à espreita da polícia. Fichada 34 vezes, em três conseguiu ser encarcerada. Duas vezes foi recolhida ao presídio feminino Madre Pelletier em Porto Alegre.
Habituada às ruas, arrombamentos e a degradação da pedra, Tina tinha o marido e os irmãos na sua cola. Por mais decepção que ela lhes dava, sempre voltavam para resgatá-la. Foi essa insistência que salvou Tina. Ou melhor, matou Tina e fez emergir Isabel. Pela mão da família, conheceu o caminho da clínica de recuperação: 40 dias na Central lhe ensinaram uma nova maneira de viver.

Anjo de uma asa só

Nas reuniões de mútua ajuda, os grupos de Narcóticos e Alcoolicos Anônimos precisam uns dos outros. São na filosofia da recuperação, “anjos de uma asa só”. Para voar, precisam da mão e da “asa” do amigo ao lado. Só se alça voo com o apoio do grupo. Por isso, os dependentes em recuperação frequentam as reuniões durante anos. Três vezes por semana, Isabel reencontra os companheiros, ouve a história deles e dá o testemunho de sua drogadição.
Da vida-zumbi, Isabel galga sua saída do fundo de poço. A cabeça emerge, resoluta, do precipício. O desafio é viver a cada 24 horas . A cada 1.440 minutos agradece. “Só por hoje viverei esse dia e não tentarei solucionar meus problemas de uma vez.” Até que o hoje se transforme em passado e o passado em uma década. Ela então receberá a famosa medalha preta dos Narcóticos Anônimos: a medalha dos múltiplos anos longe da droga. Isabel reza a filosofia que ajuda a vencer o vício: Só por hoje nunca mais.