Adoro mitologia. Sou fascinada pelos relatos míticos e creio que eles representam os desejos e refletem o mundo contemporâneo. Os humanos são muito iguais mesmo, mesmo que se passe uma eternidade de tempo. Inventaram os mitos que ainda nos fazem sacudir e pensar de modo a nos identificarmos com eles. O tédio é um dos sentimentos mais angustiantes do ser humano. Sartre escreveu "Entre quatro paredes" - que imortalizou a frase "o inferno são os outros" (três pessoas são confinadas entre quatro paredes e no início, se conhecem, descobrem seu sentimentos e até seus egoísmos. Mas também percebem que estão condenados a se verem eternamente. São torturados a ficarem uns com os outros por toda a eternidade. Eis o inferno: olharem um para a cara do outro e se aguentarem). Ó tédio. Segundo Sartre, a famosa frase denuncia duas situações interligadas. Primeiro, se dependemos unicamente dos julgamentos e das ações dos outros, abdicando de nossa liberdade essencial e intransferível, criamos nosso próprio inferno, queimamos na fornalha alimentada por nossos próprios medos, pela má-fé, pela incapacidade de autonomia. Os outros não são necessariamente os causadores do meu sofrimento. Eu mesmo faço do outro o carrasco de minha tortura. Em segundo lugar, a situação exposta na peça refere-se a pessoas mortas, a existências para sempre definidas e que se tornaram, desse modo, definitivas, imutáveis, fixas, congeladas como a estátua de bronze. Denuncia, portanto, aqueles que, ao negarem sua liberdade, preferem morrer em vida, como se pudessem coagular o sangue da existência. Estão mortos-vivos, penando no inferno ainda vivos. Para muitos, não é preciso morrer e muito menos sofrer a tortura dantesca para descer ao inferno...
Pior que tudo é saber que a condenação dos três personagens estende-se por toda a eternidade, mas o inferno sartreano é simbólico: somos homens e nossa condição humana é a liberdade. Negar tal fato é condenar-se voluntariamente ao inferno, sem haver o deus da absolvição e o demônio da tentação e da culpa. Em suma, não há desculpas, não há tábua da salvação. “Nenhum de nós pode se salvar sozinho; ou nos perdemos de uma vez juntos, ou nos salvamos juntos.” (Garcin)
Na mitologia, há Sísifo.
Sísifo fora condenado pelos deuses a realizar um trabalho inútil e sem esperança por toda a eternidade: empurrar sem descanso uma enorme pedra até o alto de uma montanha de onde ela rolaria encosta abaixo para que o absurdo herói mitológico descesse em seguida até o sopé e empurrasse novamente o rochedo até o alto, e assim indefinidamente, numa repetição monótona e interminável através dos tempos. O inferno de Sísifo é a trágica condenação de estar empregado em algo que a nada leva.
Parece esse ser o eterno retorno de Sísifo. O que me remete a Nietzsche. O filósofo questiona se desejaríamos viver eternamente a mesma vida, com toda dor e deleite, com cada pensamento e suspiro."E tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência - e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio." Você toparia viver tudo de novo...exatamente tudo igual, a mesma pedra no sapato, a mesma aranha te picando, os mesmos problemas te assombrando naquela mesma época da vida. Os mesmos amores latejando em tua cabeça e no trabalho, tudo exatamente igual. Acharia você isso obra de Deus ou do Demônio?Tudo isso se repetindo infinitas vezes?E de novo e de novo.
"Amamos a vida a tal ponto de a querermos, mesmo que tivéssemos que vivê-la infinitas vezes sem fim? Sofrendo e gozando da mesma forma e com a mesma intensidade? Seríamos capazes de amar a vida que temos - a única vida que temos - a ponto de querer vivê-la tal e qual ela é, sem a menor alteração, infinitas vezes ao longo da eternidade? Temos tal amor ao nosso destino? - Eis a grande indagação que é o Eterno Retorno. Será que eu quero passar a eternidade fazendo o que estou fazendo agora? Será que a decisão que estou tomando hoje merece ser tomada sempre e infinitas vezes? Minha vida é satisfatória o suficiente para eu querer viver de novo? Cada decisão vale para sempre! E Nietzsche, fala do amor fati. A ideia de amar o próprio destino a ponto de vivê-lo inúmeras vezes.
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As ideias de Nietzsche são correlatas. Quando ele descreve sobre "aceitar o destino", está dizendo ele que o homem deve fazer o destino, escolher suas decisões, enfim é do homem a autonomia para ser feliz. Ele é o seu super homem. E não Deus. Declarou ele que Deus está morto. E diz que os homens é que devem se declarar deuses. E a pergunta fundamental que surge com as morte de Deus é: " Tu és poderoso o suficiente para suportares ser criador? Nossa. que pergunta que retumba em minha cabeça..acho essa uma das perguntas mais inteligentes da humanidade....
Mas eu, eu não sou forte o suficiente para deixar de acreditar em Deus. Eu preciso dele. Ok, creio que nao pratico a fé,só fico na vontade de fazê-lo. Talvez por isso me sinto tao distante de Deus,,talvez para mim, ele so esteja no mundo das ideias. E eu vou procrastinando a vontade de recebê-lo verdadeiramente em minha vida. Eu vivo um tumulto interno muito grande. Creio que não vou conseguir sufocar esse tumulto nesta vida. Todos os dias, e isso sintomaticamente, ando rezando a Deus, pedindo que ele entre na minha vida e opere reviravoltas, algo até no sentido neopentecostal. Mas o dia acaba e eu, ao fazer meu exame de consciência diário, percebo que me irritei com as mesmas coisas, fui mesquinha nos mesmos momentos, pequei nos meus mesmos egoísmos. Enfim, o meu eterno retorno!
Um comentário:
Excelente postagem!
Estou juntando material para escrever um post sobre Sísifo, Tédio, Eclesiastes e Sentido da vida.
Acabei encontrando seu blog, e gostei muito da forma como expôs suas idéias.
Te desejo sucesso naquilo que deseja.
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